quarta-feira, maio 02, 2007

Piruetas na memória


Dizem que a política é um circo.
Acho injusto com os circos e com os profissionais circenses. Eles não merecem essa triste comparação.
Trago na minha memória antigas ternuras relacionadas com aquela tenda colorida e toda a fantasia que acontecia debaixo de suas lonas.
Ah... Os circos!
Vi tantos quando era pequeno!...
Minha mãe nos levava para ir nos grandiosos e também nos mambembes. E, por incrível que pareça, eu preferia estes mais mixurucas.
Onde eu morava, tinha um imenso terreno baldio que usávamos como campinho para nossas peladas. De tempos em tempos, era justamente para ali que iam os circos. Inicialmente, ficávamos chateados por deixar de jogar bola com a freqüência habitual. Mas, por outro lado, teríamos um circo ali, a metros de casa.
*

Duas companhias circenses costumavam parar por ali: o Circo Irmãos Tampinha e o Circo Império. Este último vinha com mais freqüência. Ambos eram bem furrecas, do tipo tábuas como arquibancada, não tinham animais, só atrações como mágico, equilibristas, contorcionistas, palhaços e... trapezistas. Ah, meu Deus! Aquela trapezista do Circo Império! Era a paixão de todos os meninos do bairro. Tinha um corpaço! Pelo menos, parecia ser, por baixo do maiô colante e da meia-calça. Depois da função, íamos para trás do circo, perto de onde os artistas estacionavam os seus traillers. Ali, víamos a trapezista passar. Às vezes, ela nos olhava e sorria. E a briga para disputar para quem ela tinha sorrido? A trapezista, de cujo nome não me lembro, era uma espécie de "namorada" comum da molecada. Para aquele bando de guris que só conhecia mulher pelada pelas revistinhas do Carlos Zéfiro - e isso quando os adultos nos deixavam espiar - a simples visão da trapezista de maiô colorido, ali, pertinho, já era material para os sonhos da Sagrada Confraria dos Descabeladores de Palhaço, a turma que apresentava a mão direita como noiva, que, na solidão dos banheiros ou cantinhos afastados, dedicava-se ao doce esporte do cinco contra um.
*

Posso não lembrar do nome, mas lembro perfeitamente daquelas pernocas, daquele corpo do tipo violão, infelizmente tão fora de moda entre as anoréxicas (e sem graça...) mulheres de hoje. Ela pulava pra lá a pra cá no trapézio, mas só tínhamos olhos para aquele par de coxas monumentais.
Depois de investigarmos, descobrimos que ela era casada com um dos equilibristas do circo. O que foi o bastante para imaginarmos como seria a transa de uma trapezista com um equilibrista... Cabeça de moleque tarado é um caso sério...
*

Mas hoje, lembrando daquele sorriso, percebo o quanto de tristeza havia nele. Seria ela infeliz? Talvez preferisse não levar aquela vida cigana de não ter casa, não poder criar os filhos como as mães da época criavam. O que fazia aquele sorriso ser triste? Quem sabe ela sonhasse com uma vida melhor financeiramente, ter dinheiro para ir ao salão de beleza, de ir pras lojas e gastar uma boa grana em roupas, como a gente via nos anúncios da Manchete e do Cruzeiro.
Quem sabe ela queria ter uma outra profissão. Talvez aeromoça, viajar pelo estrangeiro... Talvez médica pediatra, cuidar de crianças com aquele sorriso que ela afivelava no rosto depois de dar dois saltos mortais no trapézio.
*

Pensando na trapezista que inundou de hormônios minhas fantasias de criança-adolescente, escrevi umas palavras, uma singela homenagem de um menino-adulto sempre em revisita ao seu passado:

A flor de carne volteia no escuro da noite
entre luzes e aplausos.
Rompe a gravidade e cai
aninhando-se no sonho,
nos olhos.
no sorriso quase inocência
do menino que fui.
A carne se esvai em brumas do passado.
A flor permanece no jardim da memória.
*

Ah, minha querida trapezista... Quantas vezes embarquei naquele seu trailler, fugindo com você para um planeta distante! (E que menino não sonhou em fugir com o circo, com a artista bonita?) Onde quer que você esteja, saiba que também fui seu equilibrista, mantendo um sonho por um fio. E hoje, jogo minhas lembranças pelos ares, como malabares... cada ano que vivi, cada história que presenciei passa sempre por minhas retinas, num ir e vir. Sem deixar nenhuma saudade cair no chão.
M.S.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você está ouvindo “Beatriz”, de Chico Buarque e Edu Lobo, cantada por Milton Nascimento. Precisa dizer mais?

24 comentários:

Sandra disse...

Que lindo!! Nossa fiquei com saudades da época de criança, parece que tudo era mais mágico, mais bonito... Adorei tb a música!

Renata Livramento disse...

Oi Marco! Circo realmente remete ao encanto da infância. E lá deve permanecer, pois quando se vai ao circo depois de adulto para levar as crianças, é tudo tão diferente... Se bem que o cirque du soleil ainda emociona muitos adultos (como eu..)
Bjos e belo post!

Anônimo disse...

Oi meu amor,
passar aqui é dar continuidade aos dias tranquilos, saudosos...
Um beijo,
Syl

Anônimo disse...

Acho tão legal qdo vc mexe na sua memória e expõe suas lembranças assim,MARCO.
Muito legal mesmo.
Infelizmente eu só estive uma única vez num circo. E lembro-me que foi em Santos em algumas férias escolares,heheheh
Abração!

Claudinha ੴ disse...

Olá Marco!
Lindas ternuras. Uma paixão de menino. O circo sempre nos emociona, e é sempre lembrança doce.
Eu já me apaixonei por um trapezista, de verdade. Voei mais alto que você, ele era Burt Lancaster, que, como sabe, era também trapezista...
Seu texto me emocionou, a trilha sonora é nota dez. Um beijo e ótima semana!

Anônimo disse...

sempre fui louca por circos... um dia pensei em ser artista de um, mas analisei direitinho e vi que a única coisa que eu sabia fazer era escrever, o que escreveria eu em um circo? o painel com o horário das apresentações?
mas eu queria viajar.. me tornei jornalista e faço o que gosto.
Hoje não vou mais a circos que têm animais. Meu filho mais velho não gosta de circo, a mais nova quase não conhece... este mundo ficou distante para mim... em antigas ternuras, somente.

te beijo

Taís Morais-

Francisco Sobreira disse...

Caro Marco,
O seu texto me fez reviver os circos que chegavam à minha cidadezinha. E eram circos mambembes, mas como meninos e adultos se divertiam com eles. Principalmente com os palhaços. Não vou nem lhe perguntar se conhece a música "O Circo", de Sidney Miller, talentoso compositor que se foi prematuramente. Respeito inteiramente a escolha da música, que é bonita (e não poderia ser de outra forma, com a qualidade dos autores), mas ouso dar o meu pitaco, ou, talvez melhor, manifestar o meu desejo: a citada música de Sidney Miller me parece mais apropriada para o tema abordado (e bem) pelo amigo. Um grande abraço.

Anônimo disse...

Fui muito pouco ao circo...

Acho que umas duas vezes...

adoro seus textos, Marco.

Beijos

Anônimo disse...

Fui bem pouco ao circo...

Umas duas vezes, na verdade...

Adoro os seus textos!!!

beijos

Anônimo disse...

Oi Marco. Prazer te conhecer. Mas prazeiroso mesmo foi ter lido este seu belo post. Abraços, Mário.

Anônimo disse...

Que lindo texto!
Nunca fui muito de ir ao circo. Não sei porquê mas nunca senti essa magia!

*.*

Anônimo disse...

ah, o circo
sabe, por aqui no interior de Itape, ainda vamos ao circo...levei a Bia a uns 15 dias...c/ direito a pipoca...palhaços...trapezistas...
Ainda temos o encanto por aqui...
Beijos querido...

Anônimo disse...

Meu caro Marco,
Hoje, além do costumeiro texto enxuto, envolvente, vc me "pegou" pela emoção. Não me refiro só aos circos-de-nossa-infância, mas àquela paixão tão bem revivida por seu talento. Pura poesia, meu amigo.
Um forte abraço.

Sujeito Oculto disse...

Vai, vai, vai começar a brincadeira... fui tão pouco ao circo quando era criança!

Anônimo disse...

Quando morava no interior gostava muito..agora moro no interior novamente porque a Noruega e um interio..e sempre vem circo no verao..minha filha adora..

Anônimo disse...

abftPô...
Agora eu voltei no tempo...sempre teve circos perco de casa (na esquina), e meu, eu ia mto em circo...até o Roberto Leal eu já beijei no circo...kkkk
Lembro até hoje do terno verde dele...fora o tanto de pó que ele tinha na cara...rs
Bem, sobre eu ter indicado seu blog, é porque realmente adoro aqui e eu fico lisonjeada em saber que meu blog entra naqueles que vc não gosta de ler, mas que no final descobriu que não é bem um "querido diário", mas sim " pagando micos"...kkkk
Beijos
Quem sabe um dia c não escreve um livro meu...
Bom findy querido

Anônimo disse...

Marco, o circo ainda tem a sua magia. Ainda exerce o seu fascínio. Quem nunca se envolveu nessa atmosfera? É contagiante mesmo.
Abraços.
http://napontadolapis.zip.net
http://dulcineia.blogspot.com

Anônimo disse...

Também gosto dos mambembes. Acho que representa as raízes, ao contrário dos Ringling Bros. da vida que são antes de tudo grandes organizações. Frequentei muito os circos na minha infância com as suas arquibancadas de madeira rangendo e uma doce lembrança que me vem, é o filme Trapézio com Burt Lancaster (ex circense), Tony Curtis e a belíssima e estonteante Gina Lolobrigida, com todas as curvas na plenitude da sua forma!
Um ótimo fim de semana!

Anônimo disse...

Marco, passei aqui para te avisar que te linkei no APOIO FRATERNO. Abs.

Anônimo disse...

Nunca gostei de circo,minhas lembranças não são tão alegres, como asmática que sou, cada vez que ia ao circo voltava em crise já que as tendas eram montadas na terra batida e os animais com aquele cheiro característico solapavam as patas levantando poeira que entupia meu pobre narizinho de criança me fazendo ficar mal, aff! circo era suplício pra mim, nunca gostei de palhaços :(
Mas suas antigas ternuras eu adoro, viu?
lindo final de semana amigopratodavida
beijosssssssssss

Anônimo disse...

Eu ia a circos quando criança, mas confesso que não gosto muito. Nem de circo, muito menos de palhaço. Fazer o quê? Saliento que é das poucas diversões que não gosto. Apesar disso, você escreve tão bem que faz a gente sentir saudade até do que não curte muito :)

Um beijo e ótimo fim de semana!

Tina disse...

Marco:

Circo tem mesmo gosto de infância. E a memória me trai agora, mas posso jurar que já levei minhas filhas ao circo.

Pena que não temos mais tantos como antigamente.

beijos querido,

Fugu disse...

Tem razão, amigo ... circo era mesmo uma delícia! beijo você!

Anônimo disse...

oie meu querido Marco,que linda essa musica parecia me descrevendo,aquela foto sou eu sim ,acho que vc me conhece ja te falei isso e brigaduuuuuuu pelo carinho das gentis palavras que sempre elogia uma mulher sonhadora ,brigaduuuuu por me fazer lembrar tb dos ciscos,nossa é e sempre será minha paixao,eu sonhava figir com um circo sabia?,ris,piis é nao é só os garotos que sonham isso,adoro circo ,infelizmente até circo ja nao fazem como antigamente,te adoro,bjssssssss