sexta-feira, agosto 29, 2008

Gostei à beça!


Atendendo a milhares de pedidos, vou relatar em rápidas linhas como foi a mais que agradável noite de sábado passado, quando fiz uma palestra sobre Machado de Assis e aproveitei para fazer uma noite de autógrafos com meu livro “Popularíssimo – O ator Brandão e seu tempo”.
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O que eu posso dizer? Gostei à beça! Foi muito, muito prazeroso para mim atender ao convite da Secretaria de Educação e Cultura de Mauá e palestrar sobre o “Bruxo do Cosme Velho” (minha namorada, Sylvia, foi quem conseguiu este evento para mim). Eu nem sou especialista em Machado de Assis. Eles me perguntaram se eu poderia fazer a palestra e eu disse que sim. Especialmente porque eles iam me pagar para isso. E, se querem me contratar para fazer palestra, eu podendo puxar o assunto por um viés de História e me dando algum tempo para me preparar, posso falar sobre muitas coisas, desde a “importância da farinha de rosca no bife a milanesa” até sobre a “vida sexual do bicho da goiaba fora da goiaba”. Bem, já faço palestras há mais de 15 anos...
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Mas como eu disse, gostei à beça. Aliás, vocês sabem de onde vem essa expressão? Não? Ah, então lá vai mais uma seção “A origem das expressões de uso corrente”, que, aliás, já faz tempo que não apresento nenhuma por aqui.
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Bem, como a maioria aí sabe, “à beça” significa “em grande quantidade”. Logo, se eu gostei à beça, é porque eu gostei muito demais da conta pra caramba às pampas.
O termo vem de Gumercindo Bessa, jurista sergipano (na foto abaixo), que ousou enfrentar ninguém menos que Ruy Barbosa na famosa Questão do Acre. Em 1904, o Estado do Amazonas queria que a terras do Acre, adquiridas à Bolívia por manobras do Barão do Rio Branco, fossem incorporadas no seu espaço territorial. Os acreanos desejavam que o Acre fosse estado a parte ou melhor ainda, que fosse território a parte (ele só virou território a partir de 1920). Os amazonenses contrataram o baiano Ruy Barbosa; os acreanos chamaram o sergipano Gumercindo Bessa. Na peleja judicial que se seguiu, Gumercindo apresentava copiosas razões, fartas argumentações favoráveis ao nativos do Acre. O cabeçudo Águia de Haia chegou a ficar tonto e tomou uma goleada do Bessa que mandou bem à beça no tribunal.
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O primeiro a usar esta expressão foi o presidente Rodrigues Alves (governou no primeiro mandato de 1902 a 1906), que ao ouvir um determinado rapaz, que defendia seus pontos de vista com tanta eloqüência, apresentando tantas razões, teria dito: “O senhor tem argumentos a Bessa”, querendo dizer que ele estava se portando como Gumercindo Bessa, que sempre ia para os julgamentos recheado de argumentações.
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Pois é. A expressão caiu no gôto do povo e ao longo do tempo, os dois “ss” deram lugar ao c cedilha, mas o sinônimo de muita quantidade, de copiosidade, de abundância pegou que nem pereba em menino. Todo mundo usa isso à beça.
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Ah, sim. Vocês querem saber como foi a palestra. Bem, eu falei à beça e parece que o povo gostou à beça. Eu certamente gostei. Tinha planejado falar por uma hora, mas quando me empolgo, falo mais que o homem da cobra. Fiquei lá, tagarelando que nem pobre na chuva por duas horas e o povo só me dando trela. O título da palestra foi “Viagem pitoresca com Machado de Assis no ano de seu centenário” e meu objetivo era falar um pouco sobre a vida dele, mas também apresentar o Rio de Janeiro de seu tempo, tanto citado em sua obra. Se conseguisse despertar nas pessoas o desejo de ler os livros de Machado, aí seria maravilhoso.
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E parece que eu consegui. Uma das pessoas que foram me assistir arrastou os filhos adolescentes para que também ouvissem um pouco de Machado. É claro que os meninos foram com uma tromba dest’amanho, achando que seria um saco, e que eles nem sabiam quem era esse tal de Machado de Assis. Pois bem. Via os dois na platéia e eles nem piscavam, acompanhando tudinho. Finda a palestra, os dois pediram à mãe para comprar os livros dele, pois ficaram com vontade de lê-los, especialmente “Dom Casmurro”, de que falei especialmente. Aliás, a mãe também disse que leria todos os livros do “bruxo” que pudesse. Ah, isso é que nem Mastercard... Não tem preço!
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Mas guardei a melhor parte por último. Terminada a palestra, vêm falar comigo duas pessoas especialíssimas, dois blogueiros que foram me fazer esse carinho, essa gentileza. A primeira foi a Milena (do Mente quem diz), acompanhada do esposo, e que encheu meu coração de alegria com a sua presença (nos lemos há três anos e nunca nos conhecemos). A outra, que aí fez meu coraçãozinho transbordar de felicidade, foi surpresa total: meu grande “amigo de infância” J.F. levou a família toda, incluindo a simpaticíssima esposa Nina, a filha e minha amiga Luciana (do ...EEEPA!) com seu marido Vagner, e as filhas Juliana e Vanessa. Só faltou levarem o cãozinho beagle Ed Wood, que também é blogueiro! E mais: a Luciana tinha acabado de lançar o livro que ela ilustrou na Bienal e ela e a família foram correndo para Mauá, só para me prestigiarem! Fiquei dois passos dentro do Paraíso com a visita da Milena e da família blogueira do J.F.
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Eu e Milena
Eu e JF
Eu e Luciana
Eu apresentei a Milena ao J.F. e família e, como são pessoas maravilhosas, se entenderam rapidamente, também viraram amigos de infância e se visitam. Foi, definitivamente, uma noite maravilhosa, me diverti e me alegrei à beça. A Milena escreveu um post muito lindo sobre aquela noite (dêem uma chegadinha no blog dela para ler...). O J.F. já escreveu alguma coisa também e avisou que ainda vai escrever mais.
Definitivamente, quem tem amigos tem um tesouro! Muito obrigado, Milena, JF, Luciana e família! Vocês são legais à beça!
Fico devendo mais essa ao Brandão Popularíssimo e ao Machado de Assis...
M.S.

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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve “Noite do Prazer”, de e com Claudio Zolli. Verdadeiramente, aquela foi uma noite pra lá de prazerosa...
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E por falar em livro, gostaria de recomendar aos queridos amigos e leitores o mais novo lançamento do nosso amigo blogueiro Marcos, do Esculacho e Simpatia. O blog dele é fantástico, por conta disso até imagino como deve ser bom o livro. Eu já pedi o meu! Faça como eu! Vá até o blog dele e se informe.

quinta-feira, agosto 21, 2008

Mais dois artistas no Céu


Eu estou com a cabeça longe, pensando nas coisas do Machado de Assis, para poder falar sobre ele na minha palestra neste final de semana (vide post abaixo). Mas mesmo estando com a cabeça nas coisas do Bruxo do Cosme Velho, recentemente tive notícias ruins de dois grandes artistas que me acompanham desde o tempo das antigas ternuras.
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Primeiro foi o Isaac Hayes. E quando li que ele tinha cantado para subir, automaticamente me lembrei do tempo em que eu e meu amiguirmão Luiz tínhamos nossos gravadores e conseguimos gravar do Rádio o tema do filme “Shaft”. Era maravilhoso ouvir aquela usina de som, despejando metais em brasa, uma guitarra com distorção esplêndida, e, mais importante, aquele vocal com voz de negro, com voz de alma.
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Pois é. O Isaac Hayes que eu curtia desde tanto tempo, resolveu tirar o time de campo. E eu estava me lamentando pela partida do cara quando soube que aqui mesmo, no Rio de Janeiro, um cantor também de voz grossa, com voz de alma, silenciava de vez.
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A televisão disse: “Morreu Caymmi”. E na hora me veio na cabeça o tanto de músicas dele que eu conhecia e gostava. Entre tantas, eu tinha preferência por “Acalanto”. Ele fez essa música nos anos 40, para a acalentar a Nana Caymmi ainda em bebê. O Assis Chateaubriand, dono dos Diários Associados, adorava esta música. Se bem me lembro, o velho Dorival contou uma vez que o Chatô viu a música e a Nana nascerem. Quando a TV Tupi foi pro ar, essa era a música que encerrava as transmissões. Foi a canção que eu escolhi para tocar aqui, ilustrando este post, mas não achei o arquivo midi.
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Dorival era um artista maravilhoso. Especialmente era um ser humano maravilhoso. Eu não o conheci pessoalmente, mas gostava de vê-lo e ouvi-lo contando suas histórias. Me parecia uma pessoa do bem, uma pessoa simpática, da qual era impossível não gostar. O seu jeitão de baiano preguiçoso, malemolente era uma delícia! Uma vez ouvi, não sei quem, dizer: "existem três velocidades baixas – lenta, muito lenta e Dorival Caymmi”. Soube que ele levou doze anos para fazer a música “João Valentão”. Ué! E precisa pressa?
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Hoje eu li na coluna do Luis Fernando Veríssimo, ele falar que todo mundo tem a sua frase preferida de uma das músicas de Caymmi. Há quem prefira “oh, insensato coração, por que me fizeste sofrer?”, de “Só Louco”; há quem prefira “e assim adormece esse homem que nunca precisa dormir pra sonhar porque não há sonho mais lindo do que sua terra”, de "João Valentão"; ele, Veríssimo disse que prefere: "os clarins da banda militar, tocam para anunciar, sua Dora vai passar”...
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Fiquei pensando. Qual seria a minha frase favorita de Caymmi? É uma escolha difícil. Mas fico com “quem inventou o amor, não fui eu, não fui eu, nem ninguém”, de "Nem eu". Pelas músicas que fez, desconfio que quem inventou o amor foi Dorival Caymmi.
Fica com Deus, Isaac! Fica com Deus, Dorival!
M.S.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve “O Bem do Mar”, com Dorival Caymmi, o homem que cantava as coisas do mar como ninguém.

quinta-feira, agosto 14, 2008

Machado na cabeça!


Conforme escrevi no post anterior, no próximo dia 23, um sábado, eu estarei lançando meu livro em São Paulo, aproveitando o convite que recebi da Secretaria Municipal de Cultura de Mauá. Na oportunidade, também fui convidado a fazer uma palestra sobre Machado de Assis, como parte das homenagens que serão feitas a ele por ocasião do centenário de sua morte.
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Li comentários aqui e recebi e-Mails de amigos afirmando ser Mauá muito distante da capital paulistana. Sei que o trânsito engarrafado de São Paulo faz as noções de tempo e espaço enlouquecerem qualquer Einstein e sua Teoria da Relatividade. Já levei uma hora para andar uma distância de dois quilômetros em linha reta na Marginal Pinheiros. Se a noite de autógrafos fosse num dia de semana, eu não recomendaria a ninguém sequer pensar em aparecer. Mas num sábado e no fim da tarde, o negócio é diferente. Não acho que Mauá se localize assim tão longe. Mauá fica no ABC paulista, o que significa dizer região metropolitana de São Paulo. De carro, do centro da cidade até Santo André, no ABC, num sábado sem trânsito, leva-se 30 minutos (eu posso garantir), tanto pela Anchieta quanto pela Avenida do Estado. E de Santo André até Mauá, gasta-se uns 15 minutos, 20 no máximo (pegou a Avenida Firestone, é só seguir reto).
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De qualquer forma, eu vou entender perfeitamente os que não puderem ir, por qualquer motivo. Para os quiserem arriscar e me dar este imenso prazer, o endereço do lançamento (e da palestra) é: Teatro Municipal de Mauá – Rua Gabriel Marques, Centro – Mauá.No sábado, 23, com a palestra sobre Machado começando às 18h, seguida da noite de autógrafos a partir das 19h.
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Ainda estou preparando a palestra que farei, embora já a tenha esquematizado. Terá uma breve exposição de uma linha do tempo com fatos marcantes da vida do Machadinho (era assim que os amigos o chamavam). Depois, escolherei trechos das obras dele que falam sobre locais do Rio de Janeiro (bairros, ruas, morros etc.) e farei uma abordagem histórica. Tudo isso MUITO ilustrado. Já estou selecionando as fotos que exibirei.
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Querem saber que histórias eu contarei sobre o velho Bruxo do Cosme Velho? Tudo bem. Vou passar um trailer.
Não sei se vocês sabem, mas Machado de Assis era epilético, canhoto e gago. Tem um “causo” interessante, envolvendo o grande escritor que eu conto no meu livro “Popularíssimo – O ator Brandão e seu tempo”. Fala de como ele gostava de se relacionar com gente de Teatro. Eis o trechinho:

“Muitos artistas e autores teatrais estavam no círculo de suas amizades. Ele não só escrevia peças como também freqüentava bastidores. Tem uma história curiosa que atesta não só a sua circunspecção como revela um aspecto muito pouco conhecido. Certa vez, ele estava nos bastidores, cumprimentando atores de uma montagem, quando uma atriz lhe dirigiu a palavra:
- Senhor Machado, eu tenho notado que o senhor é um pouquinho gago...
Machado ficou vermelho de raiva. Ele não apreciava certas intimidades e principalmente detestava lhe apontarem defeitos. Encolerizado, respondeu:
- E e-e-eu te-te-tenho notado tam-tam-também que a se-se-senhora é po-po-pouco séria!”

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Machado casou-se quando tinha já seus 30 anos. Casou tarde. Provavelmente quis aproveitar a vida antes de colocar a aliança no dedo. Ou estava escolhendo com muito critério a rainha do seu coração.

Certa vez, ele foi visitar um poeta português, recém-emigrado para o Brasil junto com a família. Era o notável Faustino Xavier de Novais, que no fim de sua vida estava com o “mal dos nervos” (leia-se: “maluco de pedra”). Na casa dos Novais, Machado conheceu a irmã de Faustino, uma senhorita portuguesa de nome Carolina, jovenzinha na flor de seus...34 anos! Fulminado pela paixão, Machado aproveitou um rápido momento em que ficou a sós com a moça e caiu matando. Correu até ela, sentou-se ao seu lado, pegou-lhe na mãozinha e mandou na lata: “Quer se casar comigo?”. A senhorita Carolina (na foto ao lado) respondeu sem hesitar: “Sim!” (claro, para quem estava conformada por ficar encalhadaça, conquistar um partidão como aquele, era sopa no mel! Era a chance dela tirar o pé da lama...).
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Mas o bom Machado não teve moleza. Miguel, um dos irmãos da dama, não via com bons olhos aquele rapaz “de cor” entrando para a família de legítimos brancos europeus. Para ele, ser mulato ou um negrão zulu desembarcado d’África era a mesma coisa e não era exatamente o cunhado que ele desejava para a irmã. Mas o preconceituoso rapaz deve ter sido convencido a não ser tão implicante, visto que Machado de Assis já era um intelectual conhecido e respeitado e, além disso, estava topando tirar a moça do Caritó (um dia desses explico a origem desta expressão) e sem pedir dote.
Casaram-se. E foram muito felizes, por quase 35 anos. Até que a mais “Indesejável das Visitas” aparecesse no chalé da Rua Cosme Velho, número 18, e levasse a dona do coração “do maior escritor afro-descendente de todos os tempos” (quem disse isso foi o notável crítico Harold Bloom).
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Antes de se casar com Dona Carolina, Machado devia gostar de dar suas machadadas por aí. No meu livro, eu conto a história de uma das maiores cortesãs que a cidade Maravilhosa já viu: a bela francesa Catherine Aimée, estrela do cabaré Alcazar Lírico. Metade do Rio de Janeiro passou pela cama da moça, que vendia caro seus favores. Para arrancar-lhe um beijinho, só ofertando-lhe um anel de rubi, por exemplo. Para outras partes do corpo, o preço era muuuuito maior. Pois não é que Machado conheceu a moça? Não sei se a conheceu “biblicamente” falando. Mas olha só o elogio que ele escreveu sobre ela: “tem a boca amorosamente fresca, que parece ter sido formada por duas canções de Ovídio”. Ah, moleeeeque!
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Além de fatos sobre a vida de Machado (incluindo essa parte, huum, digamos “Revista Caras” da vida dele...), falarei sobre sua obra, com destaque para “Dom Casmurro”. Obviamente, abordarei o grande mistério da literatura brasileira: “Capitu traiu Bentinho? Ou foi apenas coincidência o filho dos dois se parecer com o amigo Escobar?”. Estou pensando em fazer uma espécie de “Programa do Ratinho” sobre isso na palestra... O que vocês acham?
M.S.
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Caros amigos leitores; A partir deste sábado estará no Playground dos Dinossauros, o outro blog onde também escrevo uma vez por mês, um post meu sobre aquele famoso jogo (um, dois três...já! A... B...C...D...E!) em que a gente preenche num papel nomes de países, animais, marcas de cigarro, de automóveis, jogadores de futebol etc. Quem lembra? Em alguns lugares chamam de “adedanha”. Para os quiserem recordar, é só clicar no link.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve o grande Waldir Azevedo tocando “Chorinho Antigo”. Essa é pra você, Machadinho!

quinta-feira, agosto 07, 2008

Pai


Noutro dia, estava dirigindo quando reparei no vidro traseiro do carro à minha frente. Estava escrito: “Amo meus filhos Natasha e Edson”. Por aqui onde vivo é mais ou menos comum isso, colocar adesivos dizendo amar os filhos. Como estava em pleno engarrafamento, fiquei matutando sobre aquilo. Pais que amam filhos é mais antigo que os rascunhos da Bíblia, mas fazer disso um anúncio, obrigar todo mundo a ler, a saber que dedicam paixão paternal pelos rebentos, para mim é novidade. Sempre achei que amar os filhos fosse coisa normal, um comportamento socialmente esperado, pelo menos na maior parte das vezes. Pelo visto, amar somente não basta. É preciso proclamar isso ao mundo, fazer todos saberem que a Natasha e o Edson (e todos os nomes que desfilam nos pára-brisas cariocas...) são muito amados.
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Claro, sempre vai aparecer alguém que, lendo o adesivo, pronuncie o famoso “Kiko”, o “kicotenho a ver com isso?”. Admito que tal pergunta perpassou pela minha mente naquele momento... A Natasha e o Edson devem se sentir felizes por serem amados pelo pai tão extremoso. O resto da humanidade... hummm... provavelmente não se importa tanto com esse amor do pai dos dois. Talvez até haja quem desconfie de um amor que precisa ser anunciado em adesivos. O amor é sempre mais bonito, mais genuíno, quando demonstrado em gestos, pequenos, médios e grandes. Meu pai faleceu quando eu era bem pequeno. Mas mesmo bem gurizinho que eu era, mesmo sem nunca ter visto ou ouvido ele dizer as palavrinhas mágicas (“eu te amo, meu filho”), sei que ele me amava e aos meus irmãos. Era explícito o orgulho dele quando me carregava para baixo e para cima na bicicleta dele. E quando perguntavam: “é seu filho, seu Ferreira?” ele sorria de um jeito só dele e dizia que sim.
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Ele proclamava aos berros que me amava quando silenciosamente cedia espaço para mim na cama dele, deixando que eu encostasse a cabecinha no ombro dele, xeretando o jornal que ele lia. Ele transbordava de amor quando interrompia a sua leitura para me explicar o que estava escrito nas historinhas em quadrinhos, especialmente as do “Pafúncio & Marocas”, do “Fantasma” e da “Família Buscapé”, esta última a sua favorita. Ele me mostrava como juntar letrinhas e, daquele jeito, eu aprendia sem sentir. A ponto de já saber ler e contar até 10 quando entrei na escolinha. Sim, definitivamente, meu pai me amava, mesmo sem nunca ter dito ou escrito isso.
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Mas ele se foi. Deixando para trás a escadinha de três “degraus” que cresceria sem pai, com todas as conseqüências relativas a isso. Talvez por isso, eu sempre gostasse de ver famílias bem estruturadas. Até em filmes e seriados. Adorava “Papai Sabe Tudo”, “Os Waltons”, “Dênis, o Pimentinha”... Apreciava ver na telinha os filhos abraçando os pais quando estes chegavam do trabalho ou voltavam de viagem.
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Às vezes, eu ficava no fim da tarde, início da noite, no portão da minha casa, olhando as modas, bestando, vendo os pais dos meus amigos voltarem do trabalho. Eles sempre traziam embrulhos (naquela época não existia sacola de plástico, as compras de supermercado eram embrulhadas em papel bege e amarradas com barbante amarelo de sisal; as coisas que se comprava na padaria vinham embrulhadas em papel cinza, amarradas em barbante fininho branco). Quando o pacote era pequeno, leve, os filhos “brigavam” para tirar da mão do pai e levar para dentro. Mas antes da “briga”, pediam a bênção. E lá iam todos, felizes, caminhando para o interior da casa. Até o cachorro ia na frente, sacudindo o rabinho de contentamento.
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Eu gostava de olhar aquela cena. Talvez, sem perceberr, eu estava ali, talvez esperando que meu pai descesse do ônibus, carregando um embrulho de pão. E eu correria até ele, sorrindo, beijaria a sua mão, trocaria o pacote pela minha mão de menino e o conduziria para casa, para a nossa casa.
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Saudades de você, meu pai. Não tenho filhos para reproduzirem em mim gestos de amor que eu te faria. Além de eu não saber a sensação de fazer estes carinhos, não os sentirei em mim, vindo de um filho meu. Tudo bem. Vai ver que nessa vida eu precise valorizar a paternidade, saber o quão importante é ter e amar filhos. Até ao ponto de escrever isso num adesivo e exibi-lo no carro para toda a humanidade.
M.S.
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Meus queridos amigos paulistas: no próximo dia 23 de agosto, a partir das 19h, estarei lançando o meu livro “Popularíssimo – O ator Brandão e seu tempo” num Teatro em Mauá –município do ABC paulista, bem pertinho de São Paulo. Fui convidado pela Secretaria Municipal de Cultura de lá e farei a noite de autógrafos com muito prazer. No mesmo dia, um pouco antes, fui convidado para fazer uma palestra sobre o centenário de Machado de Assis, no mesmo local. Quem conhece os meus textos, já sabe como é o meu jeito, imagina o que vou aprontar por lá, falando sobre nosso escritor maior. Eu focarei aspectos históricos sobre Machado e o Rio de Janeiro de seu tempo, destacando os lugares que ele citou em seus livros. No próximo post darei mais detalhes. De qualquer forma, faço questão de convidar meus diletos amigos paulistas que queiram me dar a honra e o privilégio de sua presença.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve Baden Powell, o GRANDE Baden, tocando esse diamante denominado “Se todos fossem iguais a você, de Tom e Vinícius. Essa é para o meu, para o seu, para o pai de todo mundo que está lendo esse texto.