quarta-feira, maio 28, 2008

Memórias...


Dia desses, assisti a um filme memorável. Talvez o melhor que eu tenha visto neste ano, até agora. Chama-se Longe dela. Para me adequar mais ao tema deste blog, não faço mais resenhas completas dos filmes que assisto, portanto, não quero comentar ficha técnica, qualidade da obra etc. Mas trago este filme aqui neste blog temático para falar de um dos assuntos que ele trata: memória.
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O filme conta a história de Fiona Andersson, casada com Grant Andersson, e que é acometida de Mal de Alzheimer. Quando começa a perceber que a doença está avançando, ela pede para ser internada num asilo, apesar dos protestos de seu marido. Mas realmente, já estava ficando complicado. Ela saía de casa e não sabia mais voltar, ligava o gás e ia fazer outra coisa, enfim, aquelas coisas trágicas que costumam ocorrer com quem padece deste mal. Eu tive contato mais próximo com esta doença por intermédio da Dona Vanda Brandão, a última filha viva do Popularíssimo, que me ajudou tremendamente na elaboração do meu livro. Pouco depois de eu ter colocado ponto final na minha obra, ela começou a ter os primeiros sintomas. Logo depois, estava em estágio mais avançado, a ponto de seu filho ter que interná-la, pois, segundo me disse, “essa é uma doença que afeta toda a família”. E o filme mostra isso.
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Além de eu ter apreciado muitíssimo a obra cinematográfica em questão, o seu efeito catártico em mim foi instantâneo. Admito que ter este mal é um de meus maiores temores. Não tenho nenhum caso na família, mas não significa que eu esteja imune à doença. Ninguém está.

Vejam as características do Mal de Alzheimer:
Caracteriza-se clinicamente pela perda progressiva da memória. O cérebro de um paciente com a doença de Alzheimer, quando visto em necrópsia,, apresenta uma atrofia generalizada, com perda neuronal específica em certas áreas do hipocampo, mas também em regiões parieto-occipitais e frontais.
A perda de memória causa a estes pacientes um grande desconforto em sua fase inicial e intermediária, já na fase adiantada não apresentam mais condições de perceber-se doentes, por falha da auto-crítica. Não se trata de uma simples falha na memória, mas sim de uma progressiva incapacidade para o trabalho e convívio social, devido a dificuldades para reconhecer pessoas próximas e objetos. Mudanças de domicílio são mal recebidas, pois tornam os sintomas mais agudos. Um paciente com doença de Alzheimer pergunta a mesma coisa centenas de vezes, mostrando sua incapacidade de fixar algo novo. Palavras são esquecidas, frases são truncadas, muitas permanecendo sem finalização. (Fonte: Wikipédia)

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Saí do cinema refletindo sobre o que tinha assistido. Uma das coisa que me é tão prazerosa é puxar pela memória e lembrar de fatos do meu passado. Fatos agradáveis ou não, pois todos foram importantes na minha vida. Tenho tido muito prazer em dividir minhas recordações com vocês, aqui neste blog. É como se eu colocasse em palavras o fruto de minhas sinapses, traduzir em letras funções cerebrais relativas à memória. Certa vez, Umberto Eco disse que “a memória é a nossa identidade, nossa alma”. No filme, tem uma metáfora preciosa para o entendimento do que é este mal. A doutora explica que é parecido com disjuntores de uma casa que vão se desarmando e apagando a luz dos cômodos. Até que fica tudo escuro. Um paciente de Alzheimer pode chegar até a esquecer de andar, de comer e beber por conta própria. Vira uma espécie de planta, com funções vitais. Mas uma planta. Tudo o mais é apagado.
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Quando eu saí do cinema e estava caminhando, vi uma banca de camelô, que estava vendendo antigas traquitanas. Entre elas, estava um pequeno e velhíssimo gravador de fita de rolo. Fiquei a mirá-lo. Pensei em quantas vozes, quantos sons aquele aparelho registrou. Gente rindo, cantando, fazendo festa, fazendo confissões... Vai saber o que aquela fita já tinha registrado... O gravador já deve ter sido de extrema utilidade de quem o possuía. Agora estava ali, cercado por outras bugigangas obsoletas, talvez até sem funcionar. Exatamente como a personagem do filme. Ela teve uma vida intensa. Amou, foi amada, riu, chorou, vivenciou tantas coisas. E tudo foi apagado.
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Li recentemente numa revista “National Geographic” uma matéria sobre a Memória. Ali, falava de uma mulher de 41 anos, que se lembra de quase todos os dias de sua vida, a partir dos seus 11 anos. Na literatura médica, ela é conhecida como “AJ”. Diz essa mulher: “Minha memória passa como um filme: ininterrupta e incontrolável”. Se você pergunta a ela o que ela fazia às 12h34min, do dia 3 de agosto de 1986, ela responde de pronto: “era um domingo e um rapaz de quem eu gostava ligou para mim”. Cientistas a testaram e constataram que ela não erra uma.
Uma memória assim é uma bênção e uma maldição. Recordar prazerosamente os bons momentos que vivemos é uma delícia! Mas lembrar com detalhes do que nos foi desagradável é uma condenação tão grave como a do mitológico Prometeu, acorrentado no Cáucaso, com abutres vindo diariamente lhe comer o fígado, que se reconstituía sempre.
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A matéria também fala de um certo “EP”, um senhor de 85 anos, que só lembra de algo que tenha acontecido segundos antes. Segundo a matéria, um vírus da herpes devorou-lhe a parte do cérebro onde se localiza a memória. De acordo com a revista, ele é uma espécie de câmera de VHS, cuja cabeça de fita não funciona. “Ele vê, mas não grava”.
Ele não é um idiota, que vegeta em vida. A matéria diz que regularmente, um médico vai à sua casa e lhe aplica testes. Faz perguntas como: “em que continente fica o Brasil, quantas semanas têm o ano”. E ele sempre acerta. Vai sempre o mesmo médico e ele o recebe como se o visse pela primeira vez na vida. No seu pulso, há um bracelete de alerta médico escrito “perda de memória”. E ele nem lembra que tem este problema. A cada vez que ele olha para a pulseira, toma conhecimento de que sua memória é fraca.
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Ele gosta de ler jornais, mas pergunta a todo momento coisas como: “O que está acontecendo no Iraque?”, “quem é Bush?”. Tudo bem, esta última eu também gostaria de não lembrar... Mas ele começa lendo uma notícia, e na segunda linha já esqueceu da primeira.
Sua filha diz que ele é feliz o tempo todo. “Acho que é porque não sofre nenhuma tensão na vida”.
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Será que eu também seria feliz por não me lembrar do meu passado? Visto pelo que sou hoje, diria que não. Eu gosto de minhas recordações. Elas são minha identidade, minha alma, como disse o Eco. Mas é evidente que para quem teve os disjuntores apagados, não há sofrimento algum.
Minhas memórias não são vitais para o funcionamento do meu corpo. Mas são essenciais para que eu justifique a minha existência nesta vida. Eu sou minha carne, meus ossos, meus cabelos (que estão se apagando feito os tais disjuntores...), minhas unhas... Mas sou também o que fiz na vida, o que disse, o que eu escrevi, o que vivi... Amputar estas partes do meu ser me tornará alguém deficiente. Se eu chegar a este estágio, seria bom que o nosso Pai desligasse o último disjuntor.
Eu volto a falar sobre este assunto brevemente.
M.S.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve “Memories”, com Richard Clayderman.

quinta-feira, maio 22, 2008

Antes de Partir


Tem um filme em cartaz já há algum tempo aqui no Rio (e acho que em vários lugares do Brasil também), bem interessante, chamado Antes de partir, com Jack Nicholson e Morgan Freeman, dirigido pelo sempre competente Carl Reiner. Imaginem dois doentes de câncer em estado terminal, já desenganados pelos médicos. Ou seja, o argumento tem tudo para ser um dramalhão daqueles de fazer pedra-mármore chorar.
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Pois acontece que é uma comédia deliciosa, com alguns toques de drama, é certo, mas quem assiste dá boas gargalhadas com os dois. O personagem do Morgan Freeman (Carter Chambers) é um mecânico de automóveis que tem uma vasta cultura geral (ele só erra, aliás, o autor do roteiro – que disse que o escreveu em apenas duas semanas - só erra quando fala do inventor do Rádio, que não foi o Marconi, nem o Nicolas Tesla, como ele diz. Foi o padre brasileiro Roberto Landell de Moura). Carter sente os sintomas da doença e vai pro hospital. O personagem do Jack Nicholson (Edward Cole) é multi-mega-tetra milionário. Inclusive é dono do hospital em que o Carter está. Ele se sente mal, é conduzido para atendimento hospitalar e fica no mesmo quarto do outro.
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Um dia, Cole vê o Chambers escrevendo num papelzinho. Arranca da mão dele e constata que era uma lista de oito coisas que ele gostaria de fazer antes de partir, de cantar pra subir, esticar as canelas, bater a caçoleta. Resolve intervir na lista e acrescenta outros desejos. Como ele é rico, coloca na relação coisas como “conhecer o Egito”, “andar de moto na Grande Muralha”, “subir o Himalaia”. E exatamente por ser rico ele leva o parceiro para cumprir os tópicos da lista. È praticamente impossível não sair do cinema pensando no que gostaríamos de fazer antes de ficarmos gravemente mortos pro resto da vida.
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Vai daí que a querida amiga Fernanda me passou um post-corrente que é exatamente isso. “Que oito coisas gostaríamos de fazer antes de morrer”. Como isso tem toda pinta de mexer com antigas ternuras, será um prazer atender ao pedido da Fernandinha. Aí vão os meus desejos:
- Escrever outros livros sobre atores do passado.
- Andar de helicóptero e de submarino.
- Morar em um lugar tranqüilo longe da violência urbana quando ficar velhinho (que nem este da foto).

- Conhecer vários países da Europa.
- Visitar as seis capitais brasileiras que faltam para eu ter conhecido todas.
- Curtir minha aposentadoria com saúde física e mental.
- Ver o meu amado Flamengo ser novamente campeão brasileiro, da Libertadores e Mundial de Clubes.
- Ver meus sobrinhos crescidos e bem encaminhados na vida.

Procurei colocar desejos que são possíveis, que efetivamente dão para serem atendidos. Mas é claro que eu poderia pirar e desejar coisas como morar numa mansão na ilha de Capri, ganhar um Oscar de Melhor Ator ou comprar um iate de 400 metros. Mas eu preferi não sonhar e jogar com desejos possíveis.
Diz as regras do post-corrente que eu devo indicar oito blogueiros que deverão citar seus oito desejos num texto em seus respectivos blogs.
Bem, acho que esse tipo de post-corrente tem a cara das seguintes pessoas:
- Mimi
- Lulu
- Claudinha
- DO
- Zeca
- Adelaide
- Dilberto
- Janaina
Está claro que se essas pessoas não toparem, não tem problema nenhum. Da mesma forma, se outros dentre os que vêm aqui quiserem entrar na brincadeira, sintam-se convidados.
Trailer do filme: 2min 22seg de duração


M.S.
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Na TV Antigas Ternuras, você vê o trailler do filme “Antes de Partir”.

quinta-feira, maio 15, 2008

Eu no Arte com Sergio Britto


Finalmente recebo a gravação da minha entrevista no programa “Arte com Sergio Britto”, na TV Brasil, que foi ao ar no dia 8 de abril de 2008. Não foi difícil colocar no You Tube, pensei que fosse mais complicado.
O Sergio é meu velho amigo, meu primeiro professor de Teatro, meu diretor em várias peças em que atuei, meu parceiro de autoria no texto em “Cafona, sim, e daí?” e companheiro em outras viagens teatrais que fizemos juntos.
Foi um prazer enorme ter sido convidado a divulgar meu livro no seu programa. Fiquei satisfeito com o resultado. Acho que conseguimos despertar o interesse pelo “Popularíssimo – O ator Brandão e seu tempo”.
Com vocês, a entrevista em duas partes.







Quando eu contei as duas histórias, o pessoal da produção (câmeras, assistentes, iluminadores etc.) ficou prendendo o riso para não vazar o som na entrevista. Ali eu percebi que a entrevista tinha ficado boa e que iria agradar aos telespectadores.
Gostaram?
M.S.
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Na TV Antigas Ternuras, você vê a minha entrevista no programa “Arte com Sergio Britto”.

sábado, maio 10, 2008

Mudando de prosa


Em tempos de comunicação maciça e massiva, um assunto não dura muito tempo na mass media. Especialmente a política brasileira nunca deixa as coisas ficarem monótonas nos meios de comunicação. Sempre tem uma novidade!
Mas além dos bravos rapazes de Brasília, vira e mexe, sempre surge algum assunto que catalisa as atenções. Durante muito tempo foi o caso Isabella. Isso já "cansou". Depois, veio o taradão austríaco que engravidara a própria filha. Já encheu também.
O tema da moda agora é Ronaldo e as meninas de tromba. Isso foi matéria principal no Fantástico, capa da Veja, tema de onze entre dez assuntos de rodinha de bate-papo em boteco pelo país afora.
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Bem, isso não é antiga ternura minha. Deus me livre! Quero distância de travestis e assemelhados. E quero ficar bem afastado de quem se envolve com eles também. Ao invés de falar sobre gente famosa que cai em golpes, achaques, extorsões, programas em motéis de quinta categoria, prefiro abordar um assunto totalmente diferente. Já está na hora da gente mudar de prosa.
Vou tratar da origem da expressão:

Meter a mão em cumbuca

Para quem não sabe, o significado é algo assim: uma pessoa experiente, sabida, vivida, não se envolve em assuntos escusos, não se deixa enganar facilmente pelas aparências.
Essa expressão é uma síntese de um provérbio famoso que diz: “Macaco velho não mete a mão em cumbuca”. O folclorista mineiro José Vieira Couto de Magalhães (1837-1898) garante que a expressão vem do tupi (macáca tuiué inti omundéo i pó cuiambuca opé), por conta de uma história contada por índios.
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Quem quiser caçar um macaco, basta construir um tosco mecanismo utilizando corda e uma cumbuca (cuia). Coloca-se uma espiga de milho na cumbuca amarrada pela corda a uma árvore ou em algum lugar que possa ser vista pelo símio. O bicho vê a espiga, enfia a mão na cuia e segura o milho. Só que ele não consegue retirar a espiga por aquela pequena abertura. E acreditem: ele não larga o milho para se soltar, prefere ficar preso, tentando retirar a espiga da cumbuca. Basta vir o caçador e cptura o bicho. O macaco velho vê os mais jovens caírem naquela arapuca e opta por ficar sem o milho, mas totalmente livre.
Nem é preciso ser muito inteligente para não cair naquela armadilha. Só alguém muito bobo vai enfiar a mão naquela cumbuca, contrariando todo bom senso.
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O escritor e pesquisador baiano Afrânio Peixoto (1876-1947) diz que essa história não é brasileira, que em Portugal já se conhece essa expressão faz tempo. Só que ele garante que lá não se diz cumbuca, palavra absolutamente brasileira. Lá, a expressão é “meter a mão no cabaço”. O que é bem mais complicado para nós, não é mesmo? Se algum jovem quer meter a mão na cumbuca, a gente até consegue demovê-lo dessa idéia. Mas vai tentar convencer alguém a não meter a mão no cabaço...
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Câmara Cascudo (1898-1986), um gênio potiguar, asseverava que essa expressão cultural e seu significado são bem mais antigos, que desde a Roma Antiga e até mesmo na China e Índia se comentava macacos e cumbucas.
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Se a origem é imprecisa, uma coisa é certa: uma pessoa com um mínimo de astúcia não se mete com gente e pessoas que possam comprometê-lo. A gente tem que ter muito cuidado com cumbucas. E mais ainda com cabaços!
M.S.
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Caros amigos: tenho andado muito atarefado. Por conta disso, não tenho tido tempo de atualizar com mais freqüência, nem, desafortunadamente, de visitar vocês.
Para os que perguntaram, sim, minha mãe tem estado bem melhor, graças a Deus e às orações dos amigos. Obrigado pela compreensão.
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Um beijo meu para todas as mamães.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve Ney Matogrosso cantando "Homem com H".

quinta-feira, maio 01, 2008

Só Esso dá ao seu carro o máximo


Na semana passada, os jornais divulgaram a venda da distribuidora de combustíveis Esso para a Cosan, um grupo alcoleiro brasileiro. Li a matéria e fiquei lembrando de como essa marca se tornou uma de minhas antigas ternuras.

Se você olhar acima, no painel que eu fiz para ilustrar o template deste blog, vai encontrar uma “gotinha” da Esso. Na fase pré-tigre, o símbolo dessa empresa norte-americana eram duas simpáticas gotinhas de óleo, uma com corpo de mocinha e a outra era um rapazinho. Eu tinha um chaveiro com esse bonequinho. Aliás, tinha adesivos também. E meu sonho de consumo, no tempo em que Napoleão Bonaparte trocava soldadinho de chumbo comigo, era ganhar um modelo das gotinhas em pano para a gente encher de algodão.
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Era um barato ver o desenho das gotinhas nos comerciais da Esso! Neste post estou trazendo alguns que cacei no You Tube. Acreditem: houve um tempo em que não havia controle remoto, a TV tinha imagem em preto e branco e a gente quase que só assistia à TV Tupi. Era lá que passava o Repórter Esso.
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Eu também ouvia este noticiário na Rádio Nacional, mas eram coisas diferentes. No Rádio, o locutor era o Heron Domingues, depois o Luís Jatobá e na época final do programa, era o Roberto Figueiredo. Na TV, as notícias eram lidas pelo Gontijo Theodoro (acho que destes, só o Roberto Figueiredo é vivo) Podem acreditar: de segunda a sexta, praticamente todos os aparelhos de televisão do Brasil, às 20h, estavam sintonizados na TV Tupi. Exatamente neste horário, entrava o famoso prefixo com rufar de tambores seguido de um solo de trumpete que até hoje é lembrado por quem foi garçom na Santa Ceia, como eu. Tem gente das antigas que até hoje chama o Jornal Nacional de “Repórter Esso”.
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Aliás, até onde eu sei, o Jornal Nacional é o último programa de TV que manteve o nome do patrocinador no seu título, como era comum no tempo do Teatrinho Trol, Resenha Esportiva Facit, Telejornal Pirelli, A Estrela é o Limite, Grande Teatro Imperatriz das Sedas, Sessão Dulcora e Repórter Esso. O JN inicialmente era patrocinado pelo extinto Banco Nacional. Mesmo com o fim do patrocínio mantiveram o nome porque ele dava uma idéia de telejornal para todo o país. Mas eu gostava mais de ver o Repórter Esso.
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Uma vez eu encontrei o Gontijo Theodoro num dos jantares que a minha querida amiga a comediante Nádia Maria costumava organizar uma vez por ano em homenagem aos velhos artistas do Rádio e da TV. Ela sempre me chamava para ir porque sabia que eu adorava circular entre aquele povo que tinha feito a delícia da minha infância e adolescência. Uma vez eu jantei ao lado da Neide Aparecida e conversamos bastante. Quase falei pra ela que eu costumava chamar minha mão direita de “Neide Aparecida”, mas isso é outra história...
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Pois é. Num desses jantares, encontrei o Gontijo e fiz a maior festa, falei que ele era uma de minhas lembranças de infância e ele ficou me olhando com uma cara de “você está me chamando de velho?”
Um dia desses eu faço um post só sobre o Repórter Esso.
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E então, a Esso está saindo do Brasil... Ela se instalou por aqui há quase 100 anos – desde 1912, quando chegou como Standard Oil Company, foi a primeira petrolífera a atuar no país, colocou o primeiro posto na rua, tinha o primeiro caminhão-tanque. Mais tarde, viraria Cia. Esso Brasileira de Petróleo e atualmente é ExxonMobil. No meu tempo de guri, as maiores rede de postos eram a Esso e a Shell. A Texaco e Atlantic corriam por fora. Eu gostava mais da Esso por conta dos comerciais e por usar seus produtos também.

Durante o racionamento de gás ocorrido nos anos 60, toda família tinha o seu Fogãozinho Jacaré, a querosene (caraco! Esse aí é do tempo em que eu jogava bola de gude com Matusalém!). Os mais antigos que me lêem sabem do que se trata. Os mais novos, nem desconfiam. Bem, coloquei aí ao lado uma foto do bicho. A gente comprava o querosene Jacaré para alimentar o pequeno fogareiro. Nele, eram preparados os pratos que mais demoravam a cozinhar, como feijão, carne assada. Para coisas mais rápidas, usava-se o gás parcimoniosamente.
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Nos anos 60, a Esso trocou de mascote. Saíam as minhas queridas gotinhas e entrava o Tigre da Esso. Lembro que, li sobre a origem deste símbolo. Nos EUA, certa vez, um homem parou num posto Esso para abastecer, calibrar pneus, enfim, dar um trato no veículo. Ele tirou algo do banco de trás do carro. A porta ficou aberta. Um tigre tinha fugido de um circo e resolveu justamente entrar no carro do cidadão, se refestelando no banco traseiro. O rapaz não percebeu, fechou a porta e saiu com seu automóvel. Quando ele estava numa avenida muito movimentada, ouviu um certo ronronar vindo de trás. Olhou pelo retrovisor e viu que estava dando carona para um baita tigraço!

Desesperado, ela socou a bota no acelerador, atravessando a avenida mais movimentada da cidade em segundos. Quando pôde parar, ele largou o carro e saiu gritando por socorro. O caso chegou aos jornais e a Esso aproveitou a deixa: mandou fazer um comercial em que dizia que o cara tinha posto a gasolina Esso no carro e que por isso fora como se ele colocasse um tigre no motor. A peça publicitária fez sucesso e os executivos resolveram investir no tigre como mascote. Ficou meio parecido com o “Tony”, o tigre da Kellog’s, gerou até protestos, mas acabou ficando do jeito que se conhece até hoje em dia. Trocaram o slogan: “Só Esso dá ao seu carro o máximo” por “Ponha um tigre no seu carro”.
Essa história pode ser considerada lenda urbana, mas é danada de boa, né não?
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Aqui no Brasil, o tigre da Esso também agradou. Especialmente às crianças. Eu ganhei um chaveiro com um tigrinho de plástico. Foi quando a Shell contra-atacou e lançou o Elefantinho Shell. E o jingle: “A Shell sempre dá/Aquele algo mais/Que está presente onde quer que você vá/Seja no campo, na cidade ou rodovia/Shell é o produto que você confia/Evidentemente, em cada posto Shell/Há sempre gente que gosta do que faz/Aquele algo mais/Que a Shell lhe oferece/Shell é o produto que você merece/Você pode confiar na Shell!” (moçada, eu tenho essa musiquinha na memória. Não existe essa letra na Internet, já procurei, só aqui no meu, no seu, no nosso Antigas Ternuras!).
Tigre contra Elefante e deu Tigre. Até hoje, o felino é o símbolo da Esso. Já o Elefantinho, só o pessoal que foi comissário de bordo do 14-Bis como eu é que lembra. Ah, sim. Eu também tinha um chaveiro com o Elefantinho Shell...
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A Esso já foi associada a imperialismo. No Rio, a sede da companhia ficava no Centro, defronte ao Consulado dos Estados Unidos. Sempre que algum grupo ia até o consulado para fazer algum protesto, aproveitava e quebrava uns vidros do prédio da Esso. Durante muito tempo eu passava ali na Av. Presidente Wilson, ou vindo pelo Aterro do Flamengo, olhava para o alto do prédio e me acostumara a ver ali a “lua oval azul e vermelha” da logomarca da Esso, conforme Caetano cantou na música “Paisagem Útil”. Um dia percebi que ela tinha sido arrancada. A sede da multinacional fora transferida para a Barra da Tijuca. Saía de perto de um território norte-americano diplomaticamente falando, para dentro de um outro, culturalmente falando. Como se sabe, não é possível andar cem metros na Barra sem se deparar com alguma palavra ou frase em inglês.
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Houve época em que a Esso era poderosíssima no mundo. Tem uma história que ilustra bem isso. John Rockfeller era o todo-poderoso presidente da Standard Oil (como vimos, o antigo nome da Esso). Ele foi até a China dos tempos pré-Mao evidentemente, e começou a distribuir gratuitamente fogão a querosene para a população. As pessoas riram dele, dizendo que ele tinha virado Papai Noel, que estava dando seus produtos de graça, que o lucro da companhia ia cair...

Ele ouvia isso e só sorria. Mas quando os chineses se afeiçoaram ao fogãozinho e precisavam de mais querosene, além do que ele tinha cedido em cada peça, o Rockfeller passou a gargalhar com os lucros da venda de Querosene Standard Oil para milhões de chineses... Visão empresarial é isso aí.
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Cada vez mais, vejo as marcas da minha infância/adolescência desaparecendo. Elas saem dos meios de comunicação, saem da minha vista e vão se alojar na parede da memória. É um espaço volátil, admito. Mas é um recanto para onde eu me recolho sempre e cada vez mais.
M.S.
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Na TV Antigas Ternuras, você assiste a alguns antigos comerciais da Esso e a vinheta de abertura do Repórter Esso