terça-feira, novembro 15, 2005

A voz do povo é a voz de Deus

Estava batendo papo com um amigo. Falávamos dos problemas modernos, da nossa saúde, que virou o desenho animado “A vaca e o frango”, do randez-vous da política brasileira etc. Foi quando eu mandei essa:
- Ano que vem tem eleição. Vai ser hora do povo escolher aquelas criaturinhas sórdidas para representá-lo no Congresso e no Palácio do Planalto.
O cara respondeu:
- Paciência. A voz do povo é a voz de Deus.
*
Na hora, me lembrei da origem desta expressão.
Na Grécia, havia um templo dedicado ao deus Hermes (Mercúrio, para os romanos) que funcionava como oráculo, mas era diferente do consagrado a Apolo, em Delfos. Lá, não tinha nenhuma pitonisa para interpretar a mensagem da divindade. Quando alguém queria fazer alguma consulta a Hermes, entrava no templo, entregava a sua oferenda e ia até a estátua do deus do comércio. Fazia uma pergunta baixinho, junto ao ouvido dele e, em seguida, tampava os ouvidos. Saía do templo, que ficava em uma rua muito movimentada, e, no meio da rua, destampava os ouvidos. A primeira coisa que ele ouvisse naquele burburinho era a resposta de Hermes à sua pergunta, porque “a voz do povo era a voz do deus”.
*
Como na seguinte situação hipotética. Um jovem grego, sensível e de boa maneiras, vai até o templo para fazer uma consulta. Oferenda feita, o jovem vai até a estátua e pergunta: “Ó poderoso Hermes, o que eu devo fazer da minha vida?” Em seguida tampa os ouvidos e sai do templo para ouvir a resposta do deus. E naquele momento, estava havendo uma discussão entre dois comerciantes, bem pertinho dali. Exatamente quando o rapaz destampa os ouvidos, ansioso para saber o que Hermes tinha a dizer para ele, um dos contendores grita para o outro: “Ora, vá tomar naquele lugar!”
Pronto! O rapaz acabava de ganhar uma razão de viver!
*
Este templo funcionou até fins do século IV d. C. Ali, se cultuavam os mistérios de Hermes Trimegisto. Foi o último templo a ser desativado, foi o último deus mitológico a receber oferendas. O Cristianismo àquela época já tinha se desenvolvido. Era hora da nova religião substituir as antigas crenças.
*
Eis que, dezenas de séculos depois, aquela frase do culto do deus Hermes servia para justificar a obrigação do voto para o nosso povo eleger um bando de picaretas...
Pobre deus Hermes, pobre povo...
Se bem que Hermes também era cultuado como o “deus dos ladrões”. É, então faz todo sentido...
M.S.

4 comentários:

Anônimo disse...

Cultura & bom humor: eis a razão para que eu sempre regresse,um pouco ávido,ao teu blog,Marco,meu grande.

E aqui vai-se apredendo a origem de frases provindas da patuléia.

Quanto a qual porção maior habitava o deus grego,fiquei em dúvida: se ele era mais do comércio ou dos ladrões; tanto quanto o sexo dos anjos ou a gestação precursora do ovo ou da galinha... (Será que exagerei?)

Já no que se refere a sempre tomar no toba (perdão pelo termo,meus caros),não há questionar: quem sai na pole position é mesmo o zé-povão - e não a "arraia miúda" dos Planaltos da vida,que se fosse sensata jamais votaria nela própria.

Foi por demais te descobrir este ano.

Aquele abraço.

Marco disse...

Paulinho grande Patriota! Sempre posso contar com a sua leitura atenta e opinião amiga. De vez em quando eu publico aqui a origem de algumas expressões. Em março, escrevi a origem da expressão "No tempo do Onça".
Sobre a sua dúvida: Hermes era o deus mais ocupado do Olimpo. Tanto que raramente ele foi representado sentado. Com aquelas asinhas no capacete e nas sandálias, o cara não sossegava. Ele era cultuado, indistintamente, como deus dos ladrões, do comércio, dos advogados, dos viajantes, dos condutores, dos diplomatas...Como você vê, os nossos políticos têm um pouco de cada uma dessas, er...qualidades.
Faltou eu dizer que o oráculo de Hermes ficava em Acaie, no norte da Grécia. Um forte abraço e tenha um bom feriado e uma ótima semana!

Anônimo disse...

Ai, ai, ai.. que ressaca. Ainda bem que tenho amigos. Aguardo as provocações, mais: vou fazer uma campanha no orkut prá tentar salvar o Modos!!! Obviamente, sem perder a qualidade dos leitores.

Anônimo disse...

Ô meu chapa: Você como que completa minhas croniquinhas com seus comentários porretas.

Valeu.

Tenha uma bela quarta-feira.

Abraço pernambuquês.