sábado, novembro 12, 2005

Homem Randômico


Dias desses, eu fui visitar o blog mucho loco do alemón. Ele é um dos 4 Cavaleiros do Após-Calipso (junto com Ronie, Lúcio e Leônio), que se reúnem às vezes lá no Planalto Central para ouvir, no toca-discos, Polly, Os Incríveis e outras antigas ternuras. E lá no Club Anti Social do cara (link ao lado) vi um post em que ele citava a home page Stile Media A grande novidade é que o conteúdo deste site é randômico – palavrinha moderna para “aleatório”. Isto quer dizer que cada vez que você entrar lá vai aparecer uma página diferente, sem seguir nenhuma seqüência lógica preestabelecida. O conteúdo é pura baixaria. Se quiser ver, clique aqui por sua conta e risco.
*
Mas o que me chamou a atenção foi essa palavrinha: “randômico” e seu significado. “Aleatório” é palavra bonita, de origem latina (radical “alea”=sorte). Randômico é de origem anglo-saxã, feia, esquisita (radical “random”=acaso). Fiquei imaginando: e se existisse um Homo randomicus? Alguém que fosse absolutamente imprevisível?
*
Aí eu me lembrei que houve época em que eu queria ser assim. A idéia era se alguém se aproximasse de mim não saberia como eu iria proceder. Uma espécie de metamorfose ambulante raulseixiana. Era para criar conflitos psicológicos que deveriam ser solucionados. Eu estava começando a fazer Teatro e sabe como é, né? A gente fica meio esquisito mesmo. Eu costumo dizer que fazer Teatro não tem contra-indicação, mas certamente tem efeitos colaterais. Ninguém fica a mesma coisa depois que pisa em um palco.
De qualquer forma, a fase passou. Ainda bem. Ninguém iria me agüentar daquele jeito. Mas já pensou como seria uma pessoa randômica? Já imaginou lidar com um chefe randômico? Um marido? Uma esposa?
*
As criaturas mais randômicas que eu conheço são os animais e as crianças. De forma geral, ninguém pode dizer como aquele filho da vizinha vai agir, ou mesmo garantir que o seu periquito vai proceder sempre de forma esperada. No meu tempo, adolescente era ser absolutamente randômico. Hoje, é a coisa mais previsível que eu conheço. Eles se vestem igual, andam igual, falam igual, procedem de forma absolutamente uniforme...
O Lula de 20 anos atrás era muito mais randômico do que hoje. Ele era uma força da natureza, sua indignação era genuína, mesmo reconhecendo a falta de cultura daquele cara você respeitava o seu talento, a sua capacidade de mexer com a multidão. Hoje... bem... não precisamos nem falar nada. Vamos pular esta parte.
*
E os políticos? Pode haver um político randômico? Mesmo a Heloísa Helena, que às vezes parece agir como se tivesse possuída por um belzebu capeta dos brabos, revela um certo padrão observável de comportamento. Não, definitivamente política e randomização não combinam.
*
E se eu fosse criar um personagem de quadrinhos? O “Homem Randômico”? Ele seria herói ou vilão? Provavelmente, seria um herói para uns e um vilão para muitos. Assim como o Homem-Aranha. Sempre apareceria um “J. Jonah Jameson” para identificar uma ameaça naquele ser que sempre se comporta de forma inesperada.
*
Imagino ser complicado agir, se comportar de forma inusitada nestes nossos tempos. A vida social nos padroniza e quem não está padronizado assustará os que são. Veja bem: não estou dizendo que ser randômico é agir, por exemplo, como marginal ou como um punk. Os marginais e os punks são absolutamente previsíveis. Ninguém espera que um punk use smoking e vá dançar “Fascinação” num baile de debutantes. Da mesma forma, não há um traficante que se disponha a fazer um trabalho comunitário para o “Amigos da Escola”. O que eu imagino como ser randômico é agir de forma totalmente inesperada, mesmo! Doa a quem doer! Será que alguém teria coragem?
*

Eu confesso que nem tentaria. O planeta, o país, a cidade já estão suficientemente conflituosos para eu arranjar mais sarna para coçar. Vivemos tempos terríveis. Já houve época em que havia grandes homens para nos inspirar e para nos abrigar em suas sombras. Hoje, estamos cercados por pessoas pequenas, por uma sórdida moral do salve-se quem puder ou, pior ainda, a mentalidade do “primeiro os meus interesses e o resto que se exploda”. Já nos é suficiente viver com retalhos de dignidade, tentando ser o sal da terra, lidando com o previsível e, absurdamente para muitos, resistindo a entrar no cordão.
M.S.

9 comentários:

Anônimo disse...

"Já nos é suficiente viver com retalhos de dignidade".

Marco,essa foi mestra.

Pelo menos no que se refere à fase adolescente,temos uma parecença: fugir-se do previsível.

Lembro de quando estudava no Recife e ir cortar as melenas. O fígaro: "A la John Travolta?" O que vos fala: "Não,a la mim mesmo"... Espanto geral.

Todas as pertinências no Antigas Ternuras.

Concordo contigo: vivemos tempos terríveis.

O Tempo... indecifrável como a alma dos mortos.

Abraço sabatino. E boa domingueira.

Anônimo disse...

Snif, snif... estou emocionado. Citado no AT? É demais prá mim, e ainda com uma singela alcunha. Valeu Marco,o Singular, ou ainda Senhor Ternurinha, é assim que te chamamos. Mais uma: somos pré-Beto Barbosa. Gostamos também de Carlos Santos e Pinduca. Na foto: a caveira sou eu, a 'tia' é o Leônio!!! Ah, o Modos anda meio em baixa, preocupações pós-modernas: um vai ser papai (e ainda tomou um 'gancho' do chefe por ficar demais na net), outro arrumou mais um emprego (agora já são três!!!, tô prá ficar doido), outro anda numa preguiça danada e outr está em lua-de-mel. Nossos leitores terão que ter paciência e esperar, esperar, esperar...

Anônimo disse...

Até que eu gostaria de ser essa coisa de randômico. Ao menos com os meus alunos encapetados. Sem saber qual seria exatamente a reação do professor diante de uma situação, os moleques certamente pensariam se valeria mesmo a pena aprontar. Aliás, é justamente com base na minha experiência em lidar com esta juventude atual que me apavora a idéia do exemplo de Paris correr o mundo. Se lutassem por um mundo mais justo, como nas revoluções que honraram este nome no passado, valeria a pena até apoiá-los. Mas para destroçar ainda mais este mundo que já está em frangalhos, que Deus nos livre! Sobre "Mandrake", assisti o primeiro capítulo e, sinceramente: 'Gostei não!' Por fim, já estou me divertindo com o Google Earth. Mais uma vez, valeu a dica! Abração!

Marco disse...

Paulinho grande Patriota: Puxa! Você sabe mesmo como levantar o moral da gente! Pensando bem, acho que estou mais randômico atualmente do que antes. Quando me recuso a jogar lixo nas ruas, desligo o celular nos cinemas e Teatros e clamo por cidadania e civilidade, enfrentando o riso, o deboche de tantos que preferem fazer o que "todo mundo faz", estou sendo muito pouco aleatório.
Ronie: Eu já tinha percebido o marasmo do Modos Artificiais. Pelo visto, não é só clima que anda seco no Planalto Central. Espero que tudo isso passe. "All things must pass", já cantava George Harrison.
Paulo, meu personal teacher: Sabe que no meu tempo, quando um professor procedia "randomicamente" a turma sossegava?
A Paris histórica infelizmente ficou no passado. Essa Paris global dá péssimos exemplos e anuncia um futuro sombrio.
Eu também não gostei do "Mandrake". Os diálogos são péssimos, a trama parece um fiapo. Nem parece Rubem Fonseca. Hoje vou dar a terceira e última chance para esta série.
Que bom que você acabou se entendendo com o Google Earth!
Abração a todos.

Anônimo disse...

Só uma coisinha:

Como aqui na província barbeiro também é sinônimo de cabeleireiro,o "fígaro" do meu post anterior até que não ficou tão troncho (= pernambuquês para pênsil,torto,desengonçado. Risos...)

Desde agora,desejo a todos um ameno feriado.

Anônimo disse...

Passei pra deixar um beijo. Não li nada ainda... Bom feriado! Bjs.

Anônimo disse...

...Saiba, oh, Sr. Ternura, que fico lisojeadíssimo de constar num post deste blog destinado à família brasileira.

É bom saber que gente de boa estirpe acessa meu imundo club anti social(sem hífen mesmo).

E quanto aos tempos terríveis, um comentário:
O MAL VENCEU !!

A atividade cruviânica está parada , por pouco tempo.

E é.

Anônimo disse...

oi!!! Mais num da pra desistir!!!
Td bem???
Passa lá no meu blog...
Já leu?
"Precisa-se de Matéria Prima Para Construir Um País ", do João Ubaldo...me da sua opinião!
Bjs!!

Anônimo disse...

O que dizer a você, hein, rapaz??? Seu comentário poético me comoveu... só dá pra dizer mesmo "obrigada", do fundo do coração!!! E muitos "xuacs" pra você também! Bom feriado!
PS. Quanto aos bacalhosos, melhor nem comentar... o pior é ter q aturar o Euricocô...