
- Você está acordada?
- Arrã.
- Então vira pra cá...
- Hum... Lá vem você...
- O que eu posso fazer?
- Mas eu gosto...
De fora, vem uma voz rascante, em tom bem alto:
“Tu me mandaste embora eu irei... mas contigo também levarei... O orgulho de não mais voltar...”
- AH, NÃO! LÁ VEM ESSA DESGRAÇADA COM ESSA CANTORIA!
- Não liga, Ma... Deixa ela...
- COMO NÃO LIGA? EU DETESTO OUVIR ESSA FILHA DA PUTA CANTANDO! ELA SÓ CANTA ESSA MERDA, PARECE DISCO ARRANHADO!
- Huuummm... Continua o que você estava fazendo...
- Ela me tira até a concentração...
- E desde quando você precisa de concentração pra fazer isso?
- Desde que essa cachorra começou a lavar roupa, cantando ao lado da nossa janela!
- Melhor ela cantar do que ficar espiando a gente.
- ALÉM DO MAIS É FOFOQUEIRA???
- Ela acha que eu não percebo...
De novo, a voz ressoando pelo quarto, ainda com mais volume:
“Mesmo que a vida se torne cruel... Se transforme numa taça de fel... Esse trapo tu não mais verás...”
- INNNNNGGGGG! ESSA MULHER ME TIRA DO SÉRIO...!
- Ah, ela te tira do sério? Antes você dizia que eu te tirava do sério...
- É diferente, Li. Você mexia com meu coração, quando eu te via passando com esses cabelos morenos, descendo pelas costas.... ESSA DESGRAÇADA MEXE COM A MINHA CABEÇA! Olha, te juro... Se não fosse você me pedir muito, eu já tinha ido lá e enfiava a porrada nela! Enchia a lata dela de alegria!
- E arrumar confusão a troco de quê? Nem o marido dá jeito nessa infeliz.
A voz, em alto e bom som:
“Eu seguirei com o meu dissabor... Com a alma partida de dor... Procurando esquecer...”
- MAS EU VOU RESOLVER ISSO É AGORA! ELA QUE VÁ CANTAR ESSAS MÚSICAS DE PUTEIRO NA CASA DO...unhhhh...ai...
- O que foi, Ma?
- Dor... No peito... Forte...
- Vem cá. Deita aqui. Quer que eu ligue o ventilador? Ma?... Ma?... Não faz isso... Não faz...
“...E dará o castigo depois... O castigo a quem mereceeeeeeeeeeeeeeerrrrr!...”
M.S.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve Angela Maria cantando “Orgulho”.
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Domingo é dia de eleição. É aquele dia em que chamam a gente para dar a nossa opinião sobre a vida política. Estaremos lá. Eu estarei lá.
Desde 1989, vinha votando no Lula para a presidência. Eu me empolgava com seus discursos. E o considerava uma força da natureza. Eu o aplaudi no Comício das Diretas (aquele do milhão de pessoa na Candelária, eu estava lá), no célebre comício antes do segundo turno contra o Collor. Desfilei pela Avenida Rio Branco, feliz, com minha bandeira do PT. Sempre estive com ele, nas eleições.
No domingo, não vou votar no Lula. Como diz a canção, o meu coração “é um pote até aqui de mágoa”. Eu e tantos companheiros de luta política vimos nossos sonhos serem moídos na máquina da vaidade pessoal, da ambição desmedida, do “os fins justificam os meios”... Eu sempre fui contra isso. E continuo sendo.
Era contra o governo perverso de Fernando Henrique Cardoso, que destroçou com o emprego de chefes de família, e chefiava uma corrupção competente (porque não foi descoberta...). E continuo sendo, na figura de seu candidato, o insignificante Alkmin.
Votarei em Cristovam Buarque para presidente, por acreditar que, de fato, a Educação pode realizar uma revolução neste país.
Mas, toda a minha decepção com os últimos quatro anos, me ensinou uma coisa. Não dá para votar nos candidatos e deixar pra lá. Portanto, preparem-se, meus candidatos Denise Frossard (gov.), Jandira Feghali (sen.), Fernando Gabeira (dep. fed.) e Fernando Gusmão (dep. est.). Estarei de olho em vocês, se forem eleitos. E cobrarei. Como é da obrigação de todo cidadão.
M.S.