sábado, novembro 08, 2008

Tudo ao seu tempo


Noutro dia, li uma declaração curiosa do Cícero Sandroni, presidente da Academia Brasileira de Letras. Segundo ele, no Século 19, Machado de Assis levava cerca de 20 minutos da casa dele, no Cosme Velho, até o Largo do Machado, numa distância de uns quatro quilômetros mais ou menos. E ele ia de charrete ou de bonde puxado por burros. Cícero, às vezes, leva mais de meia hora para fazer o mesmo trajeto. E ele vai de carro.
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Qual a conclusão? Andar puxado por um cavalo é melhor que os 160 do carro dele?
Na verdade, a diferença está, obviamente, não no meio de transporte, mas na quantidade de veículos que trafegam na mesma rua às épocas de ambos, Machado e Sandroni. E isso faz toda a diferença do mundo em termos de tempo.
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É comum hoje dizermos que não temos tempo para nada. Parece que o tempo voa e o nosso dia precisava ter 36 horas para darmos conta de tudo. Bem, o tempo é uma abstração, baseada em fenômenos astrofísicos. Estabeleceu-se que um dia corresponderia a 24 horas, ou seja, ao tempo em que a Terra leva para dar uma volta completa em seu eixo. Desde bem antes de Machado de Assis, o nosso planeta gasta o mesmo tempo para fazer esse movimento. Logo, os dias não encurtaram. Mas o que aconteceu?
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Aconteceu uma coisa chamada revolução nos meios de transportes. Na época de Machado, ele só marcava compromissos baseado no tempo que ele conseguia percorrer com a charrete a distância até o local determinado. E esse tempo era mais ou menos fixo. Hoje, continuamos fazendo isso, mesmo sendo uma completa abstração, visto que em ambiente urbano, ninguém pode avaliar com certeza como estará o tráfego entre o local onde se está e o que quer chegar. Sem trânsito, uns cinco minutos. Com trânsito, interrogação.
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Com o avanço nos meios de transportes, imaginamos que as longas distâncias ficaram domadas, que podemos fazer trocentas coisas ao mesmo tempo, visto que dispomos de veículos velozes. Dispomos do tempo e nem sabemos que tempo temos. Outro fator que colaborou bastante para esta percepção foi o avanço nas comunicações. Temos hoje telefone, celular, internet e tudo isso produz a sensação de espaço-tempo mais curto.
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Quando somos jovens, temos a impressão de que o tempo passa rápido. Lembro que era garoto e sonhava em fazer logo 14 anos, para poder entrar no cinema em filmes impróprios para menores desta idade. Quando dei por mim, já estava com idade para entrar em filmes proibidos para menores de 18 anos!
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Recentemente, li um texto maravilhoso do rabino Nilton Bonder em que ele fala da necessidade de darmos pausa, de sabermos o momento de descansar. Ele lembra que vivemos num mundo no qual um dia de 24 horas parece não ser suficiente. E que o nosso tempo de pausa passou a ser preenchido por diversão e alienação, tudo em ritmo frenético. Na folga, na pausa, tem gente que fica ansiosa, se perguntando “o que vamos fazer hoje?”
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Realmente, vejo que tudo nos dias de hoje incentiva a ser mais rápido, a poupar tempo. Certa vez, perguntei a um jovem porque ele escrevia em abreviações (td bm c/ vc? E coisas do gênero) e ele me disse que era para poupar tempo. Ora, mas e o prazer de escrever? Vale a pena deixar de lado? Será que o tempo poupado desse jeito é significativo?
Vejo também que há uma tendência em se abolir nas mensagens, conversas, textos nos meios de comunicação, palavras com mais de três sílabas. O que tiver, se abrevia. “Refrigerante”, por exemplo, vira “refri”; “fim de semana” vira “findi”, “aniversário” é “niver” e por aí vai. O vocabulário também tem se reduzido bastante. Deve ser para poupar tempo.
E aí volto ao texto do Bonder que tem uma frase lapidar: “Quem ganha tempo, por definição, perde. Quem mata tempo, fere-se mortalmente”.
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Tenho estado ocupado, afinal, tenho dois empregos. Cumpro expediente em um de 8h às 17h e depois vou ensaiar Teatro até 10, 11h da noite. Por conta disso, tenho rareado as visitas aos blogues amigos. É que, além de não parar em casa, ando dando valor ao meu descanso, à minha pausa. Ouço meu corpo e o atendo. Em momentos de folga, gosto de ficar, como costumo dizer, escutando cabelo crescer. Ficar desatento e ser atencioso comigo.
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Li há pouco tempo um texto-poema esplêndido de Mario Quintana (ave, mestre!):

"A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira...
Quando se vê, já terminou o ano...
Quando se vê, perdemos o amor da nossa vida.
Quando se vê, já passaram-se 50 anos!
Agora é tarde demais para ser reprovado.
Se me fosse dado, um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando, pelo caminho, a casca dourada e inútil das horas.


Desta forma, eu digo: Não deixe de fazer algo que gosta devido à falta de tempo, a única falta que terá, será desse tempo que infelizmente não voltará mais."
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Espero que vocês, amigos diletos, compreendam se não os visito com maior assiduidade. Relembrando Salomão, considerado como um dos homens mais sábios que já existiram: “Tudo tem a sua ocasião própria, e há tempo para todo propósito debaixo do Céu”.
M.S.
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No outro blog em que escrevo, o Playground dos Dinossauros, também tem um texto meu sobre o Tempo. Caso queiram dar uma espiadinha...
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve “Resposta ao tempo”, jóia de Aldir Blanc e Christovão Bastos, cantada pela sempre maravilhosa Nana Caymmi.

18 comentários:

Francisco Sobreira disse...

Caro Marco,
O Tempo é algo que está colado na gente. Estamos sempre na sua dependência. E há um tempo, digamos, psicológico. Quando esperamos por alguma coisa, ele custa tanto a passar. Aliás , por falar em tempo "psicológico", ou emocional, sempre tenho em mente uma frase de Machado (de quem você começa falando na sua postagem)em um de seus contos: "O tempo está nas nossas impressões. Há meses para os infelizes e momentos para os venturosos". Por fim, estava torcendo pelo Gabeira e lamentei ele não ter ganho. Pior para os cariocas que vão ter que engolir por, pelo menos 4 anos, esse bajulador, entre outras coisas,Eduardo Paes.

Anônimo disse...

Ontem mesmo me dei conta de que o tempo está a meu favor. Consegui separar uma horinha por dia, durante todos os próximos 40 dias, para finalmente ler "Popularíssimo" no qual, entre outros termos muito legais, li sobre "escutar o cabelo crescer".Enquanto fico em sala de espera, "esperando" a fisioterapia da minha sogra, aproveito plenamente a horinha para me fartar daquele bolo de chocolate literário!
Bjão!

Lulu on the sky disse...

Tudo na vida tem um tempo para acontecer.
Big Beijos

Claudinha ੴ disse...

Olá Marco!
Você está certíssimo. Nós 'fazemos' nosso tempo. Temos que atender às nossas prioridades, ordená-las. A vida de cada um tem que seguir o compasso em que foi escrita, quem sai do andamento atrapalha a sinfonia. Há um estudo relacionando a revolução industrial como mãe destas mudanças em nossa maneira de sentir o tempo, automotaização. Usei o estudo em minha recente monografia.
Não se preocupe com visitas, fique bem e viva cada dia de uma vez, em seu próprio tempo! Pense em você mesmo e o resto, é o resto...
Beijo.

Anônimo disse...

A verdade é que ,parece,qto mais facilidades temos nos tempos atuais,menos tempo temos pro que realmente importa,MARCO. Não se visitam mais os amigos,não se fala mais ao telefone... Agora o contacto é por email. E olhe lá.
Grande abraço!!

Moacy Cirne disse...

Andando a pé, sem pressa, levo 20-22 minutos da Gen. Glicério ao Largo do Machado. Tudo bem: o final do Cosme Velho fica mais longe uns bons 12-14 minutos (sempre a pé, bem entendido)... Mesmo assim... Sobre os gibis referidos por você em comentário no Balaio, não tenho mais nenhum deles. Mas aquela feira de antiguidades (vez por outra apareço por lá) é o máximo. Um abraço.

-=|Åñä £ú¢¡ä|=- disse...

Pôxa, a que horas você se diverte! O seu trabalho é divertido ou o teatro é o seu passatempo?

Adoro Mario Quintana e concordo com você sobre a falta de tempo. Tento viver a vida intensamente e matar as saudades das coisas que gosto e de pessoas queridas em ocasiões especiais!

Sucesso!

Bjs.

Anônimo disse...

Marco, eu costumo fazer render o meu tempo, até por conta de enumerar as prioridades. Tento fazer tudo em distancias aproximadas também, mas sou dada a um conversé fiado, é o que pode parecer perder tempo e acontece o contrário. Você nem imagina!! ;) Beijus

Janaina disse...

Primeiro: Resposta ao Tempo é sacanagem. Eu choro toda vez que ouço esta música. E às vezes, ouço só para chorar. Entende?
Segundo: Leio agora uma edição da L&PM Ouro com três romances do Machado: Memórias Póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba e Dom Casmurro. Além disso, o livro traz uma pequenininha biografia, cronologia da vida dele com obras e contexto, mapas do Rio de Janeiro e um panorama cultural do período em que o autor viveu, com roupas, meios de transporte etc. É maravilhoso.
Terceiro: Para mim, hoje, o tempo passa mais rápido. E tenho consciência de que isso pode ser falta de organização. Mas ...

Anônimo disse...

Por essas e outras que eu já guardei minha árvore de natal armadinha com lâmpadas e tudo, amanhã [leias-se mês que vem] é só pegar e ligar, viu?
Acompanho o tempo e só gostaria que ele parasse no dia do meu aniversário, rss

lindo dia amigopratodavida
beijos

Anônimo disse...

É mesmo, hoje em dia nós não usamos o nosso tempo de forma prazerosa. Nós somos usados pelo tempo! loool
Beijos *.*

Anônimo disse...

Voltei aqui para te dizer que escorreito és tu!
(he he he!)
Abração!
Ro

ARMANDO MAYNARD disse...

Vivemos ALGEMADOS pelos relógios e PRESOS pelo tempo.Um abraço,Armando(fetichedecinefilo.blogspot.com) e (lygiaprudente.blogspot.com)

benechaves disse...

Ainda bem que arranjei um tempo pra vir aqui! E me deliciar com mais um de seus textos. Mas, dizem que hoje em dia as 24 horas se resumem em 16. Deve ser devido à aceleração do sinal dos tempos, não? Passando-se três dias, já vivemos quatro. E que é por isso que tudo fica mais rápido, como o ditado atualmente em voga: 'o tempo voa'.
E realmente voa mesmo! Pior pra nós outros que envelhecemos mais depressa.
E que tempinho mais sem vergonha esse!!

Um abraço(sem tempo)...

Garota Mascarada disse...

Sou a pior pessoa pra falar de tempo, porque definitivamente eu não sei aproveitar o meu, faço tudo errado, tudo na hora "H" e sempre dá errado!

Rs...

Bjossssssssss

Zeca disse...

Marco,

finalmente arranjei um tempo pra me deliciar com seus textos! Estamos no mesmo bonde, com nossos tempos atrelados aos ventos do progresso que nos impedem de utilizarmos melhor nossos momentos de lazer. No que me diz respeito, tenho feito o máximo para utilizar os meus. Mas nem sempre encontro o precioso tempo.

Abração, meu amigo.

Mimi disse...

Claro que entendo! também ando sem tempo!
na verdade, ando aproveitando melhor meu tempo e, Graças, não perdi o grande amor da minha vida, já é domingo e só me permito abreviar o vc, tendeu?

kkkkk (hahahahahaha!)

beijos longos e duradouros

isabella saes disse...

Cadete na Arca de Noé?! Essa é muito boa, Marco!! Bj, Bella.