quarta-feira, setembro 16, 2009
Quando não existia Melhoral
O gentil leitor destas mal tecladas linhas deve lembrar dos remedinhos de antigamente, não é? Eu já falei aqui, em post anterior, que minha mãe e minha tia me davam Melhoral Infantil, Rhum Creosotado, Biotônico Fontoura, Emulsão Scott, Calcigenol, Sal de Frutas Eno, Xarope Melagrião, além de um sem-número de chás e outras mezinhas, incluindo a eventual rezadeira de espinhela caída.
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Para os mais novinhos, talvez eu esteja falando em grego arcaico. Boa parte destes remédios caiu no esquecimento ou foi substituída por outros produtos mais modernos para atenuar nossos males e carências. Pois é, rapaziada. Como diria o notável Jotaefegê: “Meninos, eu vi”. E vivi neste tempo em que vaca subia em coqueiro de tamancos. Como vocês sabem, sou da época em que “mostrar a perereca” era apenas apontar para o pequeno batráquio.
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Mas, é claro, existiu um tempo antes de eu nascer. E naquela época, os remédios eram bem diferentes dos que eu tomei. Por exemplo: quando as crianças do final do Século 19, início do 20 ficavam constipadas, tossindo à noite, as zelosas mães davam este remedinho.
Pois é, meus caros. A Bayer fabricava este xaropinho a base de heroína para a petizada de então. E as crianças ficavam tranquiiiilas, dormiam como anjinhos depois de uma boa colherada deste santo remédio. Algumas sonhavam com elefantes cor de rosa, mas a fabricante do elixir garantia que isso não fazia mal algum. Como se sabe, “se é Bayer, é bom”.
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As crianças norte-americanas também tinham seu atenuante para tosse, asma (na época se escrevia “asthma”), gripe e pneumonia. Era este aqui:
Fabricado pelo laboratório Martin H. Smith Company, de New York, esse aí levava vantagem sobre o concorrente alemão: tinha glicose para adocicar um pouco o amargor da heroína. Como se sabe, criança não gosta de remédio amargo. Mas esse, elas a-do-ra-vam!
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Mas às vezes, a asma (ou asthma...) atacava à noite, e a criança nem conseguia respirar direito, ficava arfando, parecendo uma bomba de encher pneu de bicicleta, com os pulmõezinhos fazendo “fuimmm... fuimmm...”. E o que as desesperadas mães faziam no século retrasado? A mesma coisa que as mães do século 21 fazem: botam os pirralhos para fazerem inalação. Só o remédio de hoje era bem diferente do daquela época:
Bastava aquecer a água numa panela, jogar uma colher de sopa desta maravilha a base de ópio, botar o catarrento para inalar o vapor e pronto! O anjinho voltava a dormir na paz de Deus.
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Quem tem ou teve filho na fase bebê, sabe que é comum eles acordarem no meio da noite, com cólica, ou mesmo com insônia. E tocam a chorar, impedindo os pais de dormirem. Pois é. Naquela época isso também acontecia. Ah... Mas as mães contavam com um poderoso aliado que aquietava os nenéns, fazendo-os parecer querubins no bercinho.
Esse elixir maravilhoso continha 46% de relaxante álcool e uma boa porção de ópio. A Stickey & Poor, laboratório fabricante do paregórico, garantia que bastava três gotinhas na agüinha dada a bebês de até cinco dias de nascido que acabava o chororô. Para nenéns com duas semanas, o indicado era 8 gotas. Se já tivesse maiorzinho, com mais de cinco anos, a posologia era 25 gotas. Mas e os pais? Nada? Imagina! Eles também eram filhos de Deus! Para adultos, o recomendado era uma colher de sopa bem cheia. E bons (e alegres) sonhos para todos.
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Todo mundo sabe que volta e meia criança tem dor de dentes, não é mesmo? Adulto também. No meu tempo, havia três santos remédios: “1 instante” e “1 minuto” e a fabulosa “cera do Dr. Lustosa”, feita em São João Del Rei até nos dias de hoje. Mas e naqueles tempos distantes? Como faziam para abrandar as dor dos pequerruchos? Assim, ó:
Estas miraculosas pastilhas (drops) de cocaína eram a salvação dos que gemiam de dor de dentes nos idos de 1885 em diante. E o laboratório Lloyd Manufacturing Co. assegurava que os drops melhoravam o humor de quem os chupassem. Os usuários ficavam relaxados e sorridentes, com cara de quem viu passarinho verde dançando hula-hula. Nada de choro de criança!
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E por falar em drops de cocaína, esses aqui eram benfazejos para aliviar irritação da garganta do pessoal do Século 19.
Especialmente do gogó de atores, cantores, oradores. Todo mundo usava. Que pastilha Valda, que nada!
Até imagino os vendedores ambulantes entrando nos trens e bondes anunciando: “olha o drops de cocaína! É o passatempo da sua viagem! Alivia a tosse e refresca a sua garganta! E deixa um suave frescor na sua boca!”
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Tem época que criança não quer comer, não é verdade? Na minha época, me davam Biotônico Fontoura ou Rarical. No tempo de meus bisavós, nos USA, davam uma dose deste vinho de cocaína.
Dizia a bula que bastava um cálice antes da refeições que as crianças recobravam o apetite. Papavam tudinho! E tinham a maior disposição para correr, brincar, se agitando sem parar com os dentinhos trincados. Uma maravilha!
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E por falar em vinho à base de coca, tinha um que combatia a gripe e era especialmente recomendado pelo papa Leão XIII. O Sumo Pontífice não ficava sem a sua dose diária, estava sempre com uma garrafinha desta miraculosa bebida. Dizia até que quando tomava uma talagada, via Jesus andando de velocípede a sua volta soprando catavento. O papa deu uma medalha para o fabricante, o signore Angelo Mariani. Vejam no rótulo a cara feliz do Leão XIII e seu sorrido de Mona Lisa depois de uma dose. Sem dar uma pro santo!
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Estão vendo, caros leitores? A ciência médica do Século 19 tinha os seus segredinhos para aliviar o sofrimento do povo da época. Quando eu estava pesquisando para o meu livro “Popularíssimo – o ator Brandão e seu tempo” vi nos jornais antigos que era comum as pessoas elegantes carregarem uma “bocetinha de cocaína”, como diziam naqueles tempos, para de vez em quando darem uma cafungada, como alguns faziam com rapé. Nas festas, então, era comum servirem o pozinho branco para favorecer o divertimento e proporcionar alegria aos comensais. Como se sabe, hoje em dia não se faz mais isso...
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Já que estamos falando de assuntos ligados a saúde, gostaria de mostrar este vídeo feito numa igreja evangélica, onde um pastor faz recomendações de higiene aos presentes. É muito interessante ouvir o que o pastor diz. Imagino que ele não seja da Igreja Universal, porque senão ele estaria cobrando pelos conselhos aos crentes.
M.S.
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O livro “Humor Vermelho” - onde tenho um modesto texto - foi lançado na Bienal do Livro, aqui no Rio de Janeiro, com a presença de alguns dos autores. Foi um sucesso! Um monte de gente apareceu por lá, comprando o livro e buscando nossos autógrafos. Vejam uma foto do estande da nossa editora, com os autores à frente.
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Na TV Antigas Ternuras, você vê os sábios conselhos do pastor Jajá.
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22 comentários:
Olá Marco!
Em primeiro lugar parabéns novamente pelo livro! Sucesso (mais ainda!)
Bem, este post me prendeu pelo que mais gosto. Meus remedinhos, as drogas utilizadas em poções, espíritos, unguentos e outras formas farmacêuticas que nem existem mais. As pílulas eram douradas realmente com pó de ouro. Lá em Ouro Preto, meus tios -avós faziam isto e o material era recolhido no rio que cortava a cidade, era filtrado, fervido e ia para o piluleiro "dourar as feiosas pílulas". Eu herdei alguns livros de São João Del Rei (meu acervo de tesouros do final do sec dezenove ainda), vou procurar esta fórmula. O elixir paregórico persistiu em seu uso até uns vinte anos atrás, quando os pediatras aboliram o remedinho de cólicas.
Imagine o estrago para as pobres criancinhas, o sistema nervoso devia gritar!
Adorei saber das incursões pelo mundo das drogas. Lá nos Andes as mulheres ainda colhem as folhas de coca, mas só os homens podem mascá-la e ter revelações (ê machismo absurdo!) Creio que todas elas têm um potencial clínico imenso, mas o homem (sempre o homem)deturpou seu uso e passou a inibir seus efeitos quando necessários. Neste caso do uso que apresenta aqui, como farmacêutica, claro que discordo. Mas falo de outros problemas que poderiam ser tratados.
Adorei rever os rótulos antigos e os vidros. Eles eram muito mais charmosos e duráveis. Tenho verdadeira fascinação por eles!
Olha só escrevi um post aqui!
Um beijo!
Ah!
Hoje existe um remedinho "codeína" que é receitado inclusive para bebês com tosse incessante (adivinhe o que tem nele?). Eu me contorço quando tenho que aviar a receita!Beijo!
Nossa, eu tô impressionada. Então todo mundo ficava no maior barato e ainda com consentimento dos pais. Adorei saber isso.uhauha
Pra tudo dar-se um jeito.
Parabêns novamente pelo livro, sucesso.
Beijos
Nossa vc falando de remédio antigo lembrei q tomei aquele Biotônico Fontoura pq não comia de jeito nenhum qdo criança.
Big Beijos
Nossa..que rico seu post!!!
Acho muito legal quando a pessoa se propõe a postar uma pesquisa assim..tão rica!
parabéns!
Beijos
Marco,
essa de o papa Leão XIII estar a ver Jesus andar de velocípede foi demais...rs
Onde é que vc vai escarafunchar tanta informação importante como essas? Realmente, é uma verdadeira aula de conhecimento!!!
A propósito, eu me lembro de um tal 'guaiacol', vc me informaria de que 'era' ele era? Jurássica?!?...
O nome do Pastor não é esse,não, me desculpe, mas ele se chama Dr. Óbvius Ululantis, a seu inteiro dispor! rsrsrsrs. Meu Deus, e ele ainda vai conferir!!!
Ele lembra muito um humorista famoso, preste atenção, até a voz é igualzinha...
Sua foto está perfeita.
Obrigada pelos bons momentos de (triplo)Humor...
meu querido Marco,nossa vc me faz rir de doer o estomago,ris,meu Deus,onde vc acha tudo isso,essa do papa e o velocipde,e as pastilhas valdas,e os drops,kkkkkkkkkkkkkkk,vc nao existe,brigaduuuuuuuuuuuuuuuuuuu por tudo,pelo carinho,pela atençao,pela participaçao no niver ,sem vc nada tinha graça nem valor,vc nem imagina o quanto é espeial pra mim,te adorooooooooooooooooo,bjssssss
Hoje em dia remédios a base de cocaina ou heroina chega a ser inimaginavel,Marco. As preocupações modernas com as novas fórmulas são tão exageradas ( a meu ver ) que ,certamente,nenhum destes remedios antigos seriam aprovados.
Abração!
Não foi atoa que Freud se viciou em heroína, por conta do alívio das dores que sentia pelo câncer que teve no rosto. E o elixir paregórico, assim como as pastilhas Valda, ainda foi usado lá em casa pela família, contava meu pai, achando engraçado que um remédio tão eficaz contra cólicas tivesse sido proibido. Afinal, nunca ninguém morreu por causa dele :))
Esse pastor, que "conheci" por uma mensagem, é bem uma amostra do nível a que chegou a religião em nossos tempos. Nâo digo que não continuem a merecer algum respeito as igrejas realmente dedicadas a orientar seus fiéis, embora eu não acredite em nenhuma delas. Mas a proliferação de evangélicas e pastores boçais é de assustar.
Enquanto isso, a educação continua a ser tratada como coisa de segunda pelos governos de quase todos os estados e municípios brasileiros, sem falar no federal, onde o próprio presidente acha isso besteira.
No dia do teu lançamento estava com tudo planejado pra ir até lá te dar um abraço e trazer meu exemplar, e eis que na véspera fiz uma distensão na panturrilha esquerda (quando dói, dói para ninguém botar defeito). Resultado: não dava pra aparecer na bienal, a não ser de cadeira de rodas, e aí fiquei em casa mesmo. Devo passar por lá no fim de semana, mas você não vai estar lá, vai?
Nossa, melhor parar por aqui.
Beijão!
Não esquece de me dizer onde acho o livro.
Jajah Nogueira - palestras motivacionais - O autor é médico em Dourados – Mato Grosso do Sul - http://www.jajah.med.br - Se é pastor também não sei, mas sei que é um tremendo cara de pau! #euri
Como o mundo era ignorante e continua, porque ainda existem remédios, anestésicos a base de cocaína. Enfim, Perfeito o post. A pesquisa pelas Empresas fabricantes e as embalagens de época, com as posologias foi muito interessante! Senti falta da conhecidíssima Coca-Cola no post, que no princípio, ela também era considerada remédio e vendida em farmácias, com sua devida porcentagem de cocaína, que hoje dizem ter retirado da fórmula (vai saber! continua viciante!)
Mostrou no post que, o que hoje é ilegal um dia já foi usado pela medicina. Da mesma forma que a maconha também já foi usada tanto pela farmacologia como pela indústria têxtil no passado. Será que colocaram fogo no cânhamo? Amanhã vai ter festa? :) Beijus
Ah, Marco... pra aguentar as mazelas daqueles tempos, só estando chapado mesmo...
E a Botica Veado de Ouro, famosíssima aki de SP, não fazia fortificante Veafer batizadíssimo de álcool? Minha mãe me fortificava com um vidrão disso por ano.
É o que digo: só os fortes sobrevivem.
Ah, e o mal é o que sai da boca do homem, certo?
Olá, doce Marco! Passei para deixar um grande abraço de parabéns, pelo seu aniversário amanhã... muita saúde, paz, amor, alegrias, sucesso ainda mais, e sorte sempre... Mas fico feliz em saber do livro, q vc está em mais este, e com sucesso. Eu devo ir à Bienal domingo. Ando muito atarefada e se sobrar tempo, só domingo, mesmo. Olha, essa blusa, "cor sim, cor não", não fica nada bem em vc, kkkkkkkkkkkk... Vc fica melhor em azul, ou quem sabe, verde, grená e branco. rsrsrsrs... Na vertical. rsrsrs... Mas é isso, quando der, volto pra ler com calma alguns posts. Sinto falta do seu humor. Tenho recebido os e-mails, mas tenho tido pouco tempo pra repassar alguns. Beijocas, feliz aniversário!!!
Querido!! Me manda as fotos, please!! Beijossss.
Vim tomar café da manhã com você! Cadê o bolo de aipim com coco? (rs*) Feliz aniversário!!! Felicidades!! Zilhões de beijuzinhos!!
Simplesmente sensacional, meu caro: pela pesquisa (já feita, é verdade), pelas informações, pelo humor. Um grande abraço.
Marco,
todo ser que vem a esse mundo é um pensamento de Deus. Que pensamento maravilhoso Deus teve quando criou você!
Acontece que é seu aniversário e queremos homenageá-lo,sim, e celebrar esta festa juntamente com o aniversariante...
Parabéns? é pouco; felicidades? Talvez.
Gratidão, eis a palavra para dizer tudo.
Enooooorme abraço, amigo! Comemore, celebre, agradecendo tb ao Pai esses seus lindos anos!
Grande, Marco! Parabéns pelo aniversário! Vida longa e próspera!
Caro Marco
Mais uma bela postagem. O que mais me agrada nos seus textos é que você nos põe a par de coisas que desconhecíamos, com o seu peculiar senso de humor, em que há tiradas muito boas, como aquela sobre o papa depois de tomar aquele remédio. Um abraço e um excelente fim de semana.
Ei, feliz aniversário, né?
A propósito, Ratão já sarou do zóiiim, e está trabalhando demais como sempre...
Bjão!
Que horror, Marcos!!!! Onde vc consegue essas coisas? Já posso imaginar criancinhas tendo crises de abstinência ou trocando a mamadeira ou o velocípede por mais uma dose. Brincar de Cabra Cega sob efeito do ópio devia ser um grande "barato"! Pular amarelinha chapado, então! Vc estragou o meu fim de semana, pois acabou com as minha ilusões sobre a inocência e a pureza do passado! Mas agora consigo entender certas coisas. Essas crianças cresceram e geraram gente como Mick Jagger, Janis, Hendrix, Lou Reed ou Cristianne F. Drogada e Prostituída. Todos foram chamados de drogados pq não ainda o teste de DNA.rs
Excelente post, meu velho! Excelente findi pra ti.
abração
O "meu velho" do comntário anterior foi por conta do aniversário. Parabéns e tudo de bão pra ti
abração
Rapaz, lembrei-me, com este teu texto fabuloso, de vários dos remedinhos citados: mamãe me empurrava Biotônico Fontoura juntamente com favas de sucupira para que eu melhorasse da garganta em minhas crises de faringite! Bons tempos que não voltam mais... Que gostinho bom de cachaça infantil! E aqueles tempos eram bons também nos métodos nada ortodoxos para aliviar aquela boa dorzinha, né?! Rs. Quanto ao vídeo do "lavar ou limpar", recebi por e-mail anteontem: sensacional! Abração!
P.S.: tem novidade nos Morcegos em edição especial!
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