
Eu já devo ter escrito aqui que entre a minha casa e o meu trabalho eu passo por sete colégios. Em período escolar, eu gosto de ver a movimentação dos alunos nos arredores. Às vezes eu estou com o carro parado num sinal e fico observando a moçada colegial em seus uniformes, com as brincadeiras típicas de adolescente, as meninas com seus saiotes curtos, exibindo coxas e pernas de diferentes circunferências, desde o padrão vedete do teatro de revista até a chamada dublê da Olívia Palito. E elas não estão nem aí.
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Eu sempre me lembro dos meus tempos de colégio. Era um tempo bom... Ô se não era...
Estudei num mesmo colégio do terceiro ano primário até o segundo científico, passando por admissão e ginásio. Que orgulho e saudade me trazem o meu mui querido Colégio Duque de Caxias...
É este aí da foto. Claro, no meu tempo ele não era exatamente assim. Atualmente, ele até mudou de nome, virou “Escola Duque de Caxias”.
Eu tirei essa fotografia há uns dez talvez quinze anos atrás, quando me bateu uma saudade, eu me encontrava por perto e fui até lá, ver como ele estava. Era um domingo e não pude entrar para olhar por dentro, rever salas de aula onde esquentei bancos escolares, quem sabe até rever uma antiga meleca que grudei embaixo de alguma carteira (ei, não faz essa cara de nojo, não, que toda criança já grudou meleca em carteira! Vai dizer que quando pequeno você nunca colou disfarçadamente um tarugo verde debaixo do banco, na escola? Ah, tá! Sei!...).
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Tenho tantas histórias neste velho estabelecimento de ensino!... Algumas já até contei aqui,
como a da vez que eu joguei uma pera na cara da menina mais sebosa da turma, me fazendo pegar suspensão e tendo que levar a mãe, e que quando eu matei aula,
fui caguetado por um espírito (de porco) de uma macumba onde a avó de meu amigo de bagunças frequentava.
Falei do Português que implicava com os meninos que não tomavam banho depois da aula de Educação Física por terem vergonha de mostrar o bigorrilho adolescente. O Gordo, então, com sua diminuta tripinha de porco que mais parecia uma verruga necrosada, padeceu no dia que o Portuga trancou a porta do vestiário e decretou que ninguém sairia dali sem tomar banho.
Além destas, tenho tantas outras histórias... Algumas são difíceis de descrever em palavras escritas por precisarem de gestos para que sejam entendidas.
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Lembro de uma menina que me interessou e que estudava numa sala perto do bebedouro. Para vê-la e dar aquela paquerada básica, eu ficava horas bebendo água, que nem um camelo depois de atravessar o deserto. Se me espetassem, eu esguicharia longe, que nem desenho animado do Xerife Coelho Ricochete. Ela gostava e me retribuía aqueles olhares, aquelas caras e bocas. Mas não saía disso. Um dia, me aparece no colégio o Roberto Dinamite. Ele ainda não era famoso, mas começava a se destacar no time bacalhoso sebento. Pronto! A minha musa foi ficar de papo com ele, para meu duplo desgosto: por ela falar, toda sestrosa, com outro e por esse outro ser jogador do asqueroso time rival do meu amado Mengão. Mas era só uma visita ao seu antigo colégio (o Dinamite estudou lá). Depois, a menina voltou a me dirigir seus olhares 43, mas aí eu é que não queria.
Eu era besta...
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E por falar em Roberto Dinamite, no meu tempo, o "ídolo das multidões" lá no Duque era o irmão dele, de nome Marcos, mas conhecido como Quinha. O cara era fera no futebol de salão, no handebol... Um troço impressionante! Nos Jogos da Primavera, a seleção de handebol do Duque disputava a final contra o Cruzeiro do Sul, colégio arqui-rival. O Quinha estava com o braço machucado, na tipóia, logo, não poderia jogar. Estava no banco, só fazendo número. No jogo, o Duque estava perdendo por uns três gols de diferença. O ginásio inteiro gritando o nome do Quinha. O técnico o colocou em quadra na base do desespero. Na primeira bola que ele recebeu no braço fora da tipóia, mandou um balaço que o goleiro deles está procurando por onde ela passou até hoje. Com cinco minutos de jogo, viramos e ganhamos a partida. O cara saiu nos braços da galera.
No futebol de salão, ele matava a pau na linha e no gol. Mais de uma vez eu o vi arrebentando ora como centro-avante, ora como goleiro.
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Ele não me conhecia, era bem mais velho que eu, estudava no científico enquanto eu ainda estava no início do ginasial. Mas eis que o Destino,
with a little help from my friends, como diriam os Beatles, me aprontou uma boa. Vou encontrar meus amigos num almoço em comemoração ao meu aniversário naquela de “talvez, quem sabe o inesperado faça uma surpresa”, como diria aquela música do Johnny Alf, e ele fez.
Walter, um dos meus camaradas, me bota no celular para falar com o Quinha. Eu fiquei ali falando com um dos meus ídolos de adolescência, relembrando histórias que ficaram marcadas em mim e já estavam adormecidas na lembrança dele.
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Fui membro da Banda Marcial do Colégio Duque de Caxias. Tocava tarol. Miseravelmente não há uma fotozinha sequer de mim na banda. Acho que um dia vou lá no Duque para fuçar no acervo de imagens do colégio. Eu tenho que aparecer, nem que de longe, em alguma foto. Noutro dia, estava procurando sei lá o quê e achei a minha primeira camisa da banda. Essa aí da foto.
Ah... Era tão bom! Viajávamos muito com a banda, chegamos a ir a Porto Alegre participar de um desfile do Lions Club, representando o Rio de Janeiro. Quando a gente viajava, normalmente íamos de ônibus. A direção sempre fretava dois: um para os rapazes, outro para as moças e os menorzinhos. Eu inclusive. Com treze, catorze anos, eu era um guri. Podia ir junto com as moças, visto que às vezes a porrada comia no ônibus dos rapazes. Eu achava ótimo estar no meio da mulherada. Ia sempre ao lado da baliza da banda. Aliás, pra variar, me apaixonei por ela. Seu nome era Amália Rangel. Gostaria de saber como ela está hoje. Na época, era um mulherão, um corpo de Certinha do Lalau. Ela dizia que eu era uma gracinha, que se fosse um pouquinho mais velho, me namoraria. Ai, ai... (suspiro)
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Eu gostava de ir para o colégio. Tive professores maravilhosos. Lembro de cada um deles... Professoras Damiana, Nêudima, Consuelo, Gerusa... depois os professores do ginásio, do científico... alguns são inesquecíveis: Abelard Brayner, de Geografia e História.

Quando ele descobriu que eu lia a Bíblia e sabia contar as histórias contidas neste livro, me chamava à frente da turma e pedia para eu narrar a saga dos patriarcas: Abraão, Isaac, Jacó, José... E os meus colegas prestavam a maior atenção! Devia ser o ator dentro de mim se manifestando, sem eu perceber. Uma outra professora que não esqueço era a Marília, de Português. Aprendi muitíssimo com ela. E era maravilhoso também ir para a escada de acesso à sala dos professores para vê-la subindo e olhar de relance as calcinhas dela. A moçada ia ao delírio! Aliás, por falar em calcinha, tinha uma professora de inglês que ia com uma minissaia tão pequena e se sentava tão sem-modos que a gente nas primeiras filas percebia quando ela estava com uma pequena inflamação nas amígdalas...
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Tantos ótimos professores... Joel, de Biologia; Rozendo, de Matemática; João, de Física; Gianne, de Latim e OSPB...

Mas além do corpo docente, era maravilhoso conviver com meus amigos. Hoje em dia, leio nos jornais sobre perversidades que crianças e jovens fazem uns com os outros. Por puro sadismo, por sentir prazer, espancam os mais indefesos, a ponto de tirar sangue ou mesmo deixar marcas profundas no corpo e na alma. Ir à escola para alguns é um verdadeiro suplício. Para mim, para os meus amigos, era um prazer. Não estou dizendo que éramos santinhos. Não. Eu adorava botar apelido em todo mundo, e todo mundo me botava apelido. Faziámos por gozação, não para humilhar. E ninguém daquela época virou criminoso ou teve de recorrer a psicólogo para sanar neuroses e traumas.
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Tanto é que trinta e tantos anos depois, amigos que estudaram no velho Duque, hoje são pessoas de bem, de ótima formação moral, e cultivam a verdadeira amizade. Aqueles moleques que jogavam futebol totó, futebol de botões, ou mesmo futebol no velho time Apolo Futebol Clube que criamos, ainda hoje riem e se divertem como meninos, nem levando em conta a neve do tempo que orvalhou seus cabelos. Aqueles sacanas que se apelidavam de Princesa, Boi, Filé de Borboleta, Siri, Gastão, Ossada de Dana de Teffé quando se reúnem parecem ter saído da fonte da juventude, despertando uma deliciosa inveja em quantos os vêem brincar de viver.
Um brinde a todos vocês, meus amigos, meus queridos irmãos...
M.S.

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Na
Rádio Antigas Ternuras, você ouve Bee Gees, cantando “I Started a Joke”. Essa música tem uma história comigo. Um colega meu da Banda Marcial, o Luís, tocava violão maravilhosamente. Num Festival de Música no Duque ele e um outro rapaz tocaram esta música e as meninas foram à loucura. Eu vi aquilo e o chamei para ser meu professor de violão, pois acreditava que se soubesse tocar, a mulherada estaria aos meus pés. Nem aprendi a tocar suficientemente bem, nem as moças se dignaram a me olhar... Talvez eu fosse a “piada” de que fala a letra da canção.