domingo, janeiro 27, 2008

Planeta Cassete


Estão vendo este gravador da foto? Pois é. Era o meu MP3 em mil-novecentos-e-não vem-ao-caso.
Houve uma época, no tempo em que Noé era cadete da Marinha e nem sonhava em fazer navio e se meter com Zoologia, que todo rapaz queria ter um gravador de fita cassete para registrar suas músicas preferidas.
A marca do meu era Sanyo.
*

Eu ainda tenho todas as fitas que gravei naquela época. Provavelmente nem tocam mais. Para gravá-las sem usar microfone (o som seria horrível) a gente tinha que comprar um fio com plug Phillips numa ponta e de um pino na outra. Isso para gravar do toca-discos (ou vitrola, como chamávamos na época). Ou fazer um fio com pino do tipo “macho-fêmea” nas duas pontas, para a gente filar músicas no aparelho de rádio.
Eu fazia uma seleção de músicas entre os meus discos de vinil e pedia emprestado os discos de amigos. O meu principal fornecedor era o Alcir, meu Obi wan Kenobi em termos musicais. Ele ajudou a forjar o meu gosto musical na época.
Sei que falando essas coisas como gravador cassete, disco de vinil, plug Phillips, pareço estar descrevendo objetos possivelmente encontrados na tumba do faraó Tutancamon. Ué... Fazer o quê? Sou desse tempo...
*

Ah, eu me lembro bem das músicas de minha preferência! Na verdade, eu era um boboca colonizado, só me interessava pela cultura norte-americana, vivia falando inglês, desprezando totalmente a cultura brasileira. Ainda bem que os jovens de hoje não são assim, não é mesmo?
De qualquer forma, ouvindo as músicas que eu curtia na época, comparando com as que tocam hoje no rádio... Valha-me Deus!... Eu tinha um gosto refinadíssimo!
*
Vejam só a relação de músicas de uma de minhas fitas daquele tempo (quem quiser ouvi-las é só clicar em cima do título, mas antes clique no “X” lá na barra de ferramentas para interromper a música que está tocando agora):
Ma Chèrrie amour, com Stevie Wonder.
Don’t mess with Mr. T, com Marvin Gaye.
So far away, com Carole King.
Bridge Over Troubled Waters, com Simon & Garfunkel.
If, com Bread.
Summer Hollyday, com Terry Winter.
Why can’t we live together, com Timmy Thomas.
Killing me softly with his songs, com Aretha Franklin.
Got to be there, com Michael Jackson.
Clair, com Gilbert O’Sullivan
Neither one of us, com Gladys Knight and The Pips
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E aí? Que tal? Só clássicos, heim?
Eu andava com o meu gravador pra cima e pra baixo. Gastava boa parte da minha mesada em pilhas para o bicho. Se fosse ao banheiro para tomar banho ou fazer o “número 2” (ou como diríamos na minha época: “passar um telegrama”, “ligar a chocolateira”, “botar o moreno pra nadar”, “esculpir uma cerâmica”, “esvaziar a mente”...) levava o gravador; se minha mãe me mandasse ao mercado, ou à padaria, lá ia eu com ele na mão; se fosse ao campo para jogar futebol, chegava cedo e ficava ouvindo música no Sanyo enquanto a moçada não chegava. Ou seja, meu gravador era um apêndice de mim. Era o meu mundo, o meu planeta particular.
*

Um dos programas habituais que eu mais apreciava com o gravador era ir para a casa do meu amiguirmão Luiz e ficarmos ouvindo música até meia-noite, saindo de lá com a minha bicicleta sob a preocupação da saudosíssima D. Aída, mãe dele, que, como todas as mães, ficava preocupada com adolescente andando à noite. Só que naquela época isso era possível. Não acontecia nada.
Quando eu descobria alguma música nova, gravava e levava para ouvir junto com o Luiz. Curiosamente, hoje, trocentos anos depois, ainda vou pra casa dele com DVD de show para a gente ver junto (aliás, tô com saudades desse moleque!).
*

Meu gravador era meu confidente nos desencontros de amor. Estão ouvindo esta música que está tocando na Rádio Antigas Ternuras? Pois é. Já curti dor de cotovelo ao som dela, porque uma menina não quis me namorar. Lembro que uma outra paixão recolhida me fez ouvir Fire and Rain, do James Taylor durante horas. Eu até lembro da menina por quem eu era apaixonado nessa época. Depois nos tornamos amigos, ela vive há muitos anos nos Estados Unidos com o marido.
Ah, ouvir músicas no meu velho Sanyo ajudava a fazer o rescaldo em meu coração abrasado. Tem gente que afoga as mágoas em birita. Eu afogava as minhas em notas musicais. Pelo menos meu fígado saía intacto!
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Este post fica como uma homenagem a este velho amigo que reencontrei noutro dia, quando estava procurando algumas velharias nos meus guardados. Nem tentei fazê-lo funcionar. Provavelmente seu motor já deve ter ido para o céu dos mecanismos eletrônicos. Melhor deixá-lo no seu repouso. De forma alguma eu me desfaço dele! Boa parte de minhas antigas ternuras passaram por seus botões e alavanca de controle.
Se minha alma pudesse ser fragmentada, um pedaço estaria guardado junto a velhas fitas cassete e um gravador de pilha.
M.S.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve “Think of me as your soldier”, de e com Stevie Wonder. Quem já dançou esta música coladinho com uma pequena, pode falar, como Pablo Neruda, “Confesso que vivi”. E como ele também dizer “nas alturas arderá de novo/ o meu coração ardente e estrelado”.

32 comentários:

Claudinha ੴ disse...

Olá Marco!
Agora você me fez voltar no túnel do tempo e ir parar no velho alpendre, onde me reunia com amigos e meu velho gravadorzinho. Puxa, que coisa boa. Parabéns pelo post!
Beijo!

Jack disse...

Eu mandava todo mundo ficar em silência e fechava a porta do meu quarto quando queria 'gravar' algo com microfone do rádio... Tempo bom, nós e nossos primórdios do atual MP3...
Bom domingo, bjocks

Anônimo disse...

Eu tambem sou desse tempo...hehehe,ja nao me sinto mais sozinha...kkkkkk. Fez uma bela selecao de musicas!

Anônimo disse...

Nossa! Muita coisa nem me lembrava mais! Adoro essas viagens ao passado. Dá uma saudade saudável que nem te conto!

Um beijão e ótima semana!

Lili
http://quaseamor.zip.net

Anônimo disse...

Vivi as mesmas coisas! Quando vi o nome do Terry Winter (Tommy Standen), lembrei de outros brasileiros que gravaram em inglês na época, utilizando nomes estrangeiros, como o Michael Sullivan, o grupo Light Reflections e muitos outros, mas principalmente o Maurício Alberto, o Morris Albert que foi gravado no mundo inteiro. Gravei todos eles em k-7s que até hoje ainda guardo... Apesar da má qualidade das músicas de hoje em dia, a proporção das nacionais para as americanas está a nosso favor, ao contrário daquela época...
Um grande abraço!

Anônimo disse...

Delicia de texto, Marco! :)

(para variar... rs)

Meu pai tinha um gravador desses! Ele usava para fazer as entrevistas do programa de rádio que apresentava rs

beijos

Dilberto L. Rosa disse...

Rapaz, que viagem... Literalmente! Inflizmente, todas as minhas fitas k-7 já foram perdidas pelo mofo... Mas me deste excelentes idéias de reunir algumas "seleções" gravadas em mil-novecentos-e-não-vem-ao-caso... Rs. Forte abraço, primão!

P.S.:primo, no próprio blogspot você encontra a posibilidade de abrir esta página blogspot de comentários numa nova janela - basta acessar "configurações-comentários-Mostrar comentários em uma janela pop-up?-sim" Pode crer, fica melhor pra carregar para pobres mortais discados...

Márcia disse...

Que delicia de lembrança, um gravador, uau! tinha um parecido com esse além de um rádio de pilha gigante com capa de couro que tinha um botão emperrado na Rádio Tamoyo, aff!
Que ternura essa recordação, pilhas grandes, lá se ia todo nosso dinheiro e se não as trocássemos logo derretiam deixando um cheiro muito ruim no aparelho, eca! rss, lembra?
Amigopratodavida, recordar é viver, cada dia estou mais convencida disso.
Saudades, muitas
lindos dias,
beijos

Nayara Lobo disse...

Eh Nah q se escreve msmu.
Obrigada vc por me visitar!!!
Nussa amei esse post... me fez rir com as coisas de um passado naum tão distante!
Seu blog eh ótimo...!
bjin...

[Manú] disse...

Post delicioso como sempre Marco.Bem,eu não alcancei a época destes gravadores,mesmo porque eu nunca teria dinheiro para ter um.Lembro que em 90 ainda tinha um aparelho que se chamava
"Sonatinha" e era um toca discos.Mas eu sou da época daqueles rádios gravadores com dec para fitas.Gravei um monte delas e ficava esperando as 12 mais pedidas na rádio eldorado,para gravar e dançar muito depois!rsrsrs
A sua seleção é muito bem feita ein?dela,só conheço as músicas de Michael Jackson e Stewie wonder(duas paixões minhas),Mas esta que está tocando aqui é bem no estilo do stewie que eu gosto, as baladinhas.Se bem que tb amo as de pista, aquelas onde o soul é mais vivo.O seu post me tocou muito e me fez lembrar de um livro que estou lendo: "A garota que roubava livros", onde em plena guerra nazista, uma menina rouba livros e vive imersa num mundo poético e lírico de palavras.Numa época em que muitos jovens preferiam beber e se drogar ao som de Janis Joplin, vc ouvia música e viajava nas ondas da emoção. Lindo isso!Um abraço grande!:*

Só Magui disse...

Saudade , eis o seu nome.

dade amorim disse...

Tive um igualzinho, Marco. Tenho várias fitas também, mais algumas comerciais, daqueles tempos distantes :) Maravilhosas antigas ternuras... Beijo pra você.

J.F. disse...

Marco, que volta ao passado deliciosa! Texto primoroso e seleção de músicas sensacional. Ainda tenho muitas fitas K7 (e funcionando!). Mas, antes do gravador K7, eu tive um gravador Geloso, de rolo, ainda do tempo em que Caim e Abel eram bons meninos e não brigavam. O aparelho ainda está comigo mas não funciona mais. Mas eu o guardo, assim como alguns rolos de fita (precursores do K7). Abração.

Marcos Pontes disse...

Não precisei ter meu k-7, meu irmão mais velho tinha o dele, um Philips que eu me encarregava de surrupiar de vez em quando; meu pai tinha sua vitrola e, mais avançadinho, seu 3 em 1 e o segundo irmão era compulsivo comprador de discos. Esses três caras me ensinaram um bocado sobre música. a propósito, esse disco do Simon e Garfunkel e o do Bread ainda repousam em nossa discoteca. Valeu por me fazer lembrar de uma fase deliciosa da minha vida.

Anônimo disse...

Conheço algumas das músicas de que falas. ALiás, eu adoro ouvir vinil no gira-discos do meu pai. Esses aparelhos antigos envolvem-nos numa mística completamente diferente. Actualmente, basta fazer um simples clique, num instrumentos pouco maior do que um dedo que guarda umas 300 músicas... lool Mas, antigamente havia toda uma formalidade. Escolher o vinil, limpar, ter cuidado com a forma como colocávamos a agulha...Etc! :)
Boa semana! *.*

Anônimo disse...

Neste ponto a tecnologia tem sido muito madrasta das lembranças,MARCO.
Também sou desta época e adorei a sua lista de clássicos.

O engraçado é que tenho conhecidos que já encaram os cd's de forma saudosa,como que não se conformando com os tempos do mp3.
É a vida!!

Abração!


http://www.ramsessecxxi.blogger.com.br

Luma Rosa disse...

Dessa listinha, não tenho Stevie Wonder, Terry Winter, Timmy Thomas e Gilbert O’Sullivan. O resto tenho em CD! (rs*) Refiz o que consegui em CD. Pra não dizer que não tenho nada em fitas, tenho Give my regards to broad street do Paul McCartney, que não consegui achar.
A minha mãe me torrava e não deixava que ouvisse música na vitrola o dia todo. Música era ao vivo, ela tocando piano, meu pai violão. Eram meio seresteiros. Tenho muitas, muitas lembranças fragmentadas também. Quem não tem? Beijus

Isabella Kantek disse...

Marco, adorei o post nostalgico, a discografia! E a colagem que ilustra o cabeçalho do blog. Queria agradecê-lo pela, fiquei muito feliz.
Voltarei mais vezes. =)

Tina disse...

Oi Marco!

Nossa quantas recordações ao mesmo tempo! Eu gostava tanto dessa música "Clair"... bons tempos aqueles em que o Michael Jackson ainda era um ser normal...

Obrigada pelas recordadoes,beijos e boa semana,

isabella saes disse...

Querido! Adorei o post, cheio de nostalgia... Uma coincidência: falo de Noé também no meu último post. Passa lá depois. Beijo grande, Bella.

Anônimo disse...

Olá querido Marcos! Estou por aqui para matar as saudades de seus posts, mas a verdade é que para uma balzacquiana, pssar por aqui , signific ficar com saudades, não é? Como sempre vc consegue tirar lá do fundo do baú as emoções que nem lembrávamos que ainda existiam. Passa lá no Madame, postei algumas coisas modestas no intervalo de meu segundo livro e adoraria sua visita... beijos de mim

Anônimo disse...

Oi Marco, Que delicia este post! vc tem um gosto musical muito bom! Parabéns! Bjus

Lila Rose disse...

Eu também adorava minhas fitas cassete! Lendo seu post fiquei me perguntando onde foram parar... não lembro. Talvez minha mãe tenha as jogado fora.

Eu adorava fazer minha seleção musical também. Mas, lá em casa a música brasileira reinava. Eu adorava cantar Nelson Gonçalves...hahahaha... e cantava com meu pai todas as músicas de Roberto Carlos. Cuidávamos dos vinis como quem cuida de um bebê.

Hoje continuo gravando minhas músicas preferidas, mas em CD, né?

O importante é curtir o efeito mágico e quase medicinal que as músicas exercem sobre nós.

Bisous.

Cris disse...

Nossa Marco, eu nem me lembrava mais dessa música do Stevie Wonder... ela ta aqui rolando , rolando, rolando... maravilha!
Olha só, esse seu post é daqueles que a gente lê e reconhece as memórias como sendo quase que idênticas àquelas vividas.
Lembrei-me das minhas gravações, aquelas feitas de vinis ou do rádio. Pegava meu "elepê" ou "compacto", fazia meu ritual de preparar o ambiente para a gravação fechando tudo e rezando para que ninguém falasse alto ou espirrasse durante o evento! E quando eu gravava uma música do rádio e aquele locutor abelhudo interrompia antes do final? Poxa, tudo isso está muito vivo na minha memória tb, assim como as músicas, afetos, fossas e momentos!
Ah, a sua listinha de música tem tudo a ver... São daquelas que ouvimos e nunca nos cansam! Aliás, confesso que as músicas do final dos anos 60 e as da década de 70 são as minhas mais queridas.

Adorei seu post! Acabamos conhecendo seu blog através do Playground dos Dinossauros - O Paulo e eu - e sempre que posso dou uma passadinha por aqui :) Ótima semana pra vc! Abraços.

Anônimo disse...

Querido Marcos, acho quete vi no Jô, vc escreveu uma biografia sobre um ator (Brandão), não é? Que chic! Não me lembr de vc ter citado o antigas ternuras, acho que deveria, afinal o conteúdo é excelente!
Não sumi do seu site, só tenho tido como parar pra escrever-lhe, mas estou sempre aqui!! Obrigada pela visita! Ainda não publiquei o meu primeiro livro, pois estou me dedicando ao segundo,rsrsr, vai entender... Mas até outubro todos terão surpresas!! Teaviso... beijocas

Fabiana disse...

Oi Marco!
Tudo bem?
Eu morri de saudade do meu gravadorzinho antigo! Era parecido com o seu!! Rsrsrs!
Adoro até hoje escutar Stevie Wonder, amo a Carole King, a Aretha nem se fala!! Bateu uma saudade dos velhos tempos...
Saudade da época que eu descobri o gosto pela música, pela gravação.
Daí cresci e virei uma viciada em música, em cantar, palco... Mas tudo começou no meu gravadorzinho!
Um beijo!

Moacy Cirne disse...

Mais uma postagem arretada de boa. Só que as minhas músicas eram outras... E as suas recordações carnavalescas, meu caro? Um grande abraço.

Stella disse...

Oi, Marco. Olha eu sou suspeita para comentar este seu post. Amo Marvin Gaye, Aretha Franklin, Simon & Garfunkel e outros que você não citou. São clássicos e não vou deixar de incluir Barry White entre eles pois gosto da voz deste músico americano também.
Agora, o que me encantou foi você lembrar-se dos versos do Neruda no final do seu texto.
Vou agora mesmo colocar a Aretha para cantar e pegar os poemas do Neruda! Romantismo em alta e boas lembranças numa noite chuvosa de janeiro.

Um abraço e até mais!

Anônimo disse...

Atire a primeira pedra quem nunca "curtiu uma fossa" ao som de James Taylor! E quem nunca gravou uma fitinha super selecionada pra paixão da vez! Rs... As minhas estavam guardadas até bempouco tempo, mas... o velho tem que abrir espaço para o novo! Beijos cheios de saudade e de orgulho, afinal, você (que já era famoso) está ficando famosérrimo!! Bom carnaval! (Ana Carla -ana_carlac@hotmail.com)

Lena Gomes disse...

É, Marco, só vc pra me fazer "viajar no tempo", em plena terça de carnaval... conheço praticamente todas aí da sua lista de clássicos. E sabe q recentemente comprei num "sebo" de discos de vinil na feira do meu bairro, o álbum duplo do show de Simon e Garfunkel no Central Park??? E também a trilha sonora do filme Yentl, com a Barbra Streisand... pois é, também faço as minhas loucuretes... comprei em vinil, porque ainda tenho toca-discos, hehehe... e volta e meio ponho as bolachas pra rodar...
Adorei mais um post seu. Fazer o quê, tenho q ser repetitiva!!! Beijos.

ninguém disse...

Marco. E eu, que bem antes de ter um gravador "portátil" (que pesava 200 quilos) trabalhei com gravador de rolo, na rádio gaúcha. A gente editava com gilete e durex: rodava a fita para trás, cortava e colava direitinho! Meus deuses.
bj

Anônimo disse...

Pô Marcão...
Fiquei fora do ar um mês e qd volto vc me faz chorar,,, muita sacanagem sua!
Sem comentários. Um beijo do amiguirmão!