domingo, abril 22, 2007
Um caguëte de outro mundo – 2a. Parte (Final)
No capítulo anterior, eu comecei a contar uma de minhas travessuras do tempo do colégio e as respectivas conseqüências, que depois viriam a culminar com uma delação vinda do mundo dos mortos. Se você não leu ainda, recomendo que leia primeiro o post abaixo para colocar-se a par dos fatos.
A situação era desesperadora. Eu e Roberto GBO estávamos perdendo aulas direto. Resolvemos apelar para os céus. No caso, para Nossa Senhora da Penha.
Mais uma vez, pular o muro da linha do trem, andar sobre os dormentes, arriscar a vida na ponte de ferro, pegar o trem. Paramos na estação da Penha.
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A igreja da Penha é famosa por ficar num penhasco (óbvio...O nome já está dizendo). Muita gente faz promessas e pedidos à santa, na esperança de receber uma graça. A nossa graça era aquela história se resolver sem que a minha mãe e a avó dele entrassem no circuito. Decidimos subir os 365 degraus da igreja de joelhos para comover a santa e o milagre acontecer.
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Começamos a subir juntos. Não deu certo. Era só um olhar para a cara do outro para cair na gargalhada feito hienas enlouquecidas. Resolvemos nos separar. Ele ficaria no outro lado da escada. Mas não teve jeito. Bastava que um olhasse para o outro e ambos se mijavam de tanto rir. Será que a santa iria aceitar um sacrifício daquele jeito?
*
No dia seguinte, entramos na sala. Ficamos quietinhos. O coordenador apareceu e a história se repetiu. É. Não tinha jeito. Tínhamos que contar para nossos responsáveis e agüentar as conseqüências.
Em casa, eu olhava para a minha mãe, fazendo o jantar... e cadê coragem para falar? Ficava rodeando ela, feito cachorro que comeu o presunto e está envergonhado.
Acabei falando. Ouvi um dos famosos esporros de D. Ruth. Daqueles que fariam as trombetas do Apocalipse parecerem caixinha de música para bebês.
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E lá fui eu para o colégio, com a minha mãe e seu olhar fuzilante sobre mim. Entramos, ela foi para a coordenação, eu fui para a sala. Encontro lá o Roberto GBO com os olhos arregalados, parecendo que tinha visto o Drácula montado na mula-sem-cabeça correndo atrás do lobisomem.
- Você trouxe a sua avó? Teve coragem para contar pra ela?
- Não foi preciso. Entregaram a gente de bandeja.
- Como entregaram?... Quem entregou?
Foi quando ele me contou uma triste história.
A avó dele era macumbeira. Freqüentava um terreiro de umbanda. No dia anterior, ele estava tentando reunir coragem para confessar o acontecido, quando a velha foi no terreiro. Lá, ela se consultou com uma das entidades, um cabôco, um preto velho, sei lá. Só sei que o espírito (de porco) contou toda a história para a avó do GBO. Contou minuciosamente. Parecia um travesti descrevendo uma festa de casamento. Com riqueza de detalhes. Falou do trem, da praia de Ramos, da igreja, tudo, tudo, tudo! Eu nunca vi um troço desses! Um Cabôco Língua Grande!
A avó chegou em casa cuspindo fogo que nem dragão profissional! Apertou o GBO que não teve como negar.
Ou seja: A avó estava naquele momento lá na coordenação, junto com a minha mãe.
*
Como diria Madre Teresa de Calcutá, em momentos difíceis:
- Agora é que fodeu tudo de vez!
O coordenador veio nos chamar, fomos até a sala dele e eu temia entrar na porrada lá mesmo. Encontrei minha mãe bem calma. Estranhamente calma... Ela só me disse:
- Em casa conversamos...
Duvido que Tiradentes, ao ouvir a sentença de morte, tivesse sentido o que eu senti naquele momento.
Cheguei em casa já pensando em fazer o meu testamento. Minha mãe só disse o seguinte:
- Um mês sem sair de casa. Você só sai para ir ao colégio. E volta direto pra casa.
" AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAUUUUUUUUUUUUGHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
PelamordeDeus!! Tudo, menos isso! "
Fui pegar o fio de ferro:
- Me bate! Me espanca! Arranque o meu couro! Mas não faça isso comigo!!!
*
Ela fez. Passei um mês trancafiado em uma cela de segurança máxima.
Na sagrada hora do futebol das tardinhas, os meus amigos vinham me chamar e eu dizia que não podia ir jogar. Eles perguntaram porquê e eu só falei:
- Macumba!
M.S.
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No outro dia, estava fazendo a ronda nos blogs amigos, passei no Playground dos Dinossauros, um blog-irmão deste Antigas Ternuras, também dedicado a relembrar doces momentos do passado (são quatro dinossauros autores, um deles é o Itiro que vem sempre aqui). Lá, vi um texto em que falava de viagem no tempo, como vocês sabem, uma de minhas mais queridas e antigas ternuras. Perguntava que viagem no tempo nós, leitores, gostaríamos de fazer. Eu respondi: voltar à minha adolescência, quando ia para o colégio encontrar meus amigos, depois voltava para casa, para ver National Kid na TV e jogar futebol no campinho de várzea.
Daí, me veio à mente este momento difícil que passei. Hoje, eu revivo isso tudo com um sorriso nostálgico. É muito bom ter vivido histórias assim para ter o que lembrar, o que recordar, o que contar para os amigos.
No próximo post, escreverei sobre o National Kid.
Em tempo: se vocês acham que eu inventei tudo isso, perguntem ao meu amigo-irmão Luiz, que sempre lê este blog e era meu colega de escola neste tempo...
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Na Rádio Antigas Ternuras, você está ouvindo uma de minhas antigas e deliciosas ternuras: "O Bom Menino", com meu ídolo de infância, Carequinha. Eu deveria ser um bom menino, mas...
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32 comentários:
eu já estava ansiosaaa pra ver o desfecho da história!! huauAUhau meu, vc narra mto bem... olooooko!! leia o ultimo post do blog do meu amigo: http://muitoconceito.zip.net/ fala sobre narrativas, lembrei de vc!! beijoooo
Olá Marco! Ótimo texto, adorei! E não é que eu adivinhei sobre o espírito de porco? Hahaha, acho que vamos competir com as nossas artes, eu fui danada também e resolvi começar a contar algumas. Só vou maneirar porque o meu BB anda lendo meu blog e encontrando argumentos novos para me desarmar (rsrs).
Vai falar no Nacionaro Kido? Ah... eu vi alguns episódios, mas os que mais via eram Ultra Seven e Ultra Man, e seus monstros inacreditáveis!
Um beijo e um excelente domingo procê.
22 de abril, día de la tierra. Quién no la respeta, no respeta la humanidad.
22 of April, day of the land. Who does not respect it, does not respect the humanity.
22 d'avril, jour de la terre. Qui ne la respecte pas, ne respecte pas l'humanité.
22 نيسان يوم الارض. فمن لا يحترم ومن لا يحترم الانسانيه.
22 von April, Tag des Landes. Wer es nicht respektiert, respektiert nicht die Menschlichkeit
22日,一天的土地. 谁不尊重,不尊重人性. 4月の22、土地の日。
4月の22、土地の日。 それを尊重しないかだれが、人間性を尊重しない。
22 апреля - День земли. Кто не уважает его, не уважать человечество.
22 de Abril, dia da terra, quem não a respeita, não respeita a humanidade
22 της ημέραης Απριλίου, του εδάφους, που δεν το σέβονται, δεν σέβονται το Ανθρωπότητα
David Santos
Grande Marco! Após um certo tempo sem visitar o Antigas Ternuras, finalmente coloquei a leitura em dia por aqui. Você está mais impagável do que nunca, hein! Abração!
q bom q matou nossa curiosidade!!!
E claro q acredito em vc, não lhe vejo em absoluto como um anjinho por aí..rs..rs...
bjos, querido!
hahahahahaha
Cada uma... rs
Que história hein? E a mesma maestria de sempre (padrão Marco de qualidade) na hora de narrar...
Minha infancia foi um tanto fraquinha em histórias...
imagina a da geração playstation como vai ser...
beijos
É sempre gosotoso ouvir ou ler histórias da infância, nossa ou dos outros... E as suas são ótimas. Um beijo.
Caro Marco,
Deixei pra comentar depois que lesse a segunda parte. O problema não é não acreditar em você, mas no seu amigo, Será que ele lhe contou a verdade? De todo modo, mais uma lembrança da sua infância que você conta com a graça e a desenvoltura que já conhecemos. Um grande abraço e uma excelente semana.
Oi, Marco. Obrigado pela visita. Fiquei contente de ver seu blog e encontrar logo de cara uma história, justo na época em que ando falando bem disso de contar histórias. Reparei que nascemos os dois num 18 de setembro. Eu nasci no ano de MCMLXXVIII. E você? Abração!
Das coisas que mais sinto falta quando estou sem tempo de navegar, Marco, uma das principais é, sem dúvida, vir aqui te visitar e ler estes textos saborosíssimos. Os dois últimos estão um verdadeiro primor. Vou seguir em frente e ler o resto. Abraços sinceros.
Oi Marco,
obrigado pela menção imerecida do nosso Playground! Estou sempre aqui pq me sinto em casa, (chego de chinelos e de cuecas...) e os seus textos sempre ótimos, uma delícia.
Eu acredito piamente nessa sua história pois uma medium americana que a minha mulher foi visitar um dia, sabia de coisas que só nós sabíamos. Simplesmente assustador! O bom da coisa é que esses espíritos, pelo menos no nosso caso, queria o melhor para nós.
Um grande abraço!
Macumba mesmo! lool
Ainda bem que gostou da música! Sim, ele faz lembrar freddie mercury. Aliás, ele fala de mercury na música! Ouça com atenção!
Quanto à escrita portuguesa. Eu acho a nossa escrita fantástica. Maravilhosa mesmo! É um dos nossos maiores tesouros!
Boa semana! *.*
Oh seus danadinhas tinha que haver castigo né
hihihiihih, eu imaginava que fosse algo assim.
só fiquei curiosa de uma coisa: o GBO apanhou ou ficou de castigo? rs
te beijo
taís
Marco:
Ser caguetadado por um "caboco" é demais, não. E imagino, preso por um mês. É o fim do mundo para quem, nesta época, queria estar em outro lugar.
Mas ficou a estória, inesquecível.
É lendo este blog que eu vejo que,definitivamente, eu não vivi... eu sempre fui um ótimo garoto... kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk... e o melhor é que, quando eu aprontava, ninguém acreditava que eu tinha feito qualquer coisa - a culpa sempre caía nos outros...
Abração!
Que história ótima, Marco! Estou morrendo de rir! E você conta com um jeito que só você mesmo... Beijos!
Sei muuito bem o que vc deve ter sentido com esta "pena" que sua mama te aplicou na época,MARCO.
Lembro-me que eu odiava ter que ficar em casa estudando ao invés de ir jogar futebol com os amigos ou brincar,seja lá o que fôsse. Era a morte,heheheh
Mas taí algo que vc poderá falar,ops escrever em breve: sobre o NATIONAL KID.
Adorava demais!!
Abração e otima semana.
Marco,
suas antigas ternuras sempre me trazem ao coração as minhas... embora nunca tenha passado por uma experiência tão sobrenatural.
Esta "viagem" que venho fazendo à procura das minhas próprias trilhas tem trazido muitas delas também e, quando retornar, pretendo colocá-las em minhas janelas.
Grande abraço.
Amei!!
Até que o tal espírito foi bem simpatiquinho, mandou bem e poupou seu amigo de contar pra vózinha, né não?
Sabia que minha avó subiu a escadaria da Penha de joelhos? pois é, tudo pra livrar o filhote dela da guerra e deu certo,ainda bem.
feliz semana amigopratodavida
beijosssssssssss
rssssss...
Tadinho! Tão angelical!
rssssssssssssssssssssss....
Querido amigo, essas reminiscências, ao mesmo tempo que me mataram de rir (bem feito, quem mandou ser custoso?) provocaram também algumas reflexões sobre a infância atual.
Esses pequeninos de hoje nunca poderão sequer sonhar com essa inocência e liberdade, com essas bobagens deliciosas que eram pecado em nossa época e, no entanto, tão simples, puras e divertidas.
Creio, Marco, que compartilhar desses momentos foi causa de termos corações tão cheios de ternura, coisa que hoje, as crianças desconhecem.
Obrigada, meu mágico preferido.
beijos
hahahaha sua mãe cortou um dobrado pra te colocar freio, heim?? Hoje deve ser agradecido!! Beijus
Verdade Verdadeira!!!!!!!!
Muito engraçado, engraçado mesmo!!!! Isso é um verdadeiro espírito de porco. Engraçado Marcos que eu vivi minha infância no Vale do Amanhecer e sei muito bem o que seu amigo vivia com a avó macumbeira, pois lá no Vale temos contato com estas entidades. Dá uma lida no Modos e vê os post que coloquei. A música de fundo realça mais ainda tudo que você passou.
Meu caro Marco,
Sei que estou sendo, mais uma vez, repetitivo, mas o que mais me agrada em sua escritura é esse raro talento de tratar as questões sérias com o humor de sempre. Fiz duas leituras de seu texto. A primeira serviu como alimento para o espírito: a emoção estética que um bom texto sempre nos proporciona, incluindo aqui o bem-estar trazido por seu fino humor. A segunda leitura foi do fato em si, a razão de ser de sua postagem, a "entrega" do cabôco. Confesso que já deixei de lado essa prisão da lógica, essa tola ilusão de que a Razão nos explica tudo. Enfim, quem sou eu para, em nome de um "saber" científico provisório, duvidar do que quer que seja?
Um forte abraço, meu caro!
KKKKK...Marco, chuta que é macumba!!!! Que coisa doida...adorei o post!!! Graças a Deus, minha mãe nunca foi ao colégio. Ao contrário de vocês meninos, nós aprontamos e sempre damos um jeitinho da culpa cair sobre vocês!!! Bisous e uma ótima semana!!! Quando chegar do trabalho vou ver direitinho os horários da peça, viu??? E Z.É é simplesmente MARAVILHOSO!! SE VOCÊ NÃO VIU, CORRE QUE TERÇA TEM MAIS!
Obs: removi o comentário anterior.
Nossa, que história!!! Quero ler a continuação!!!
Ah, o meu blog mudou de endereço! Ficaria feliz se vc passasse por lá! O link novo é http://fernandaruiz.freehostia.com
Kisses
Nem todos conseguem fugir do castigo. Com certeza esses acontecimentos marcaram sua vida. Quanto a voltar no tempo, gostaria de voltar aos 4 anos, idade que não tinha responsabilidades, somente sonhos.
Beijos de fogo.
Olá!
Passei pra conhecer seu cantinho. Estava no blog de amigos e acabei saindo aqui rsrs. Muito bom seu texto, gostei bastante.
Otima quinta-feira pra ti!
um abraço.
Querido Marco, se vc for lá no DD, do dia 30/8/06 vai entender porque "inglês ainda é minha língua"
bjo e ótimo domingo!
Muuuuuito bom, Marco!!!
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