quinta-feira, maio 18, 2006
Meu Clube de Esquina
Nas noites do meu tempo de moleque, a gente não costumava ficar em casa só vendo televisão. Se não estivesse passando nada que prestasse, íamos para a rua brincar de pique-bandeira, de garrafão, de carniça. As meninas brincavam de roda, de passar anel, de queimada... Os adultos botavam cadeira na calçada e ficavam conversando e vendo a gente brincar. As mulheres fofoqueiras e suas línguas de chicote aproveitavam e falavam mal da vida de todo mundo da rua. Era impressionante como tinham assunto para comentar sobre os outros e nada sobre o próprio rabo.
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Eu e meus amigos costumávamos ficar numa esquina, encostados no muro da casa do Domingos, falando sobre futebol, filmes ou sobre as moças. De vez em quando fazíamos “psiu” para uma ou outra que passasse por ali. Gastávamos o tempo olhando os vagalumes tremeluzirem no campinho de futebol. Numa noite, a moçada estava ali jogando conversa fora quando faltou a energia. Não se enxergava nada naquela noite sem lua. Mesmo assim, ninguém arredou pé. Se já não se tinha o que fazer em casa com luz acesa imagina sem força elétrica. A conversa prosseguiu no mesmo tom, na mesma falta de assunto.
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Mas é impressionante como quem não tem o que fazer arruma idéias de jerico. Numa hora lá o Messias virou para o Leleco e perguntou: “Duvida eu tirar a roupa e correr pelado no escuro daqui até a outra esquina?” O outro respondeu de prima: “Duvido!” Messias veio então com a proposta: “Se tu for comigo eu vou! Vamos?” Leleco topou e perguntou se os demais acompanhariam. Ninguém quis. Nessas horas, o meu sensor IVDM* estava sempre ativado. (* Isso Vai Dar Merda)
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Ato contínuo, Messias e Leleco tiram a bermuda, a cueca e a camisa. Ninguém via nada naquele breu. Alguém gritou “já!” e eles foram, trotando, rindo pra cara um do outro. Estavam naquele passo de gazela desfilante, passando diante da vila onde tinha a maior concentração de fofoqueiras por metro quadrado, todas sentadinhas, estalando o chicote das línguas. Por lá passavam os dois pelados...quando voltou a luz.
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Primeiro foi o susto dos dois. Depois, das fofoqueiras, sentadas nas cadeiras na calçada. Umas riram, outras gritaram, outras chamaram pelos maridos. A partir daquele instante, Leleco e Messias dispararam na direção do fim da rua. Pena ninguém ter cronômetro, mas a impressão geral é que os dois bateram o recorde mundial dos 100 metros rasos.
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Durante uns quinze dias, nenhum dos dois botou a cara na rua. Nestas duas semanas, o chicote das faladeiras cantou mais que o do Zorro. E nós, encostados no muro da casa do Domingos, tínhamos assunto para comentar enquanto os vagalumes pisca-piscavam no vazio aromático do perfume das damas da noite...
M.S.
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Na Rádio Antigas Ternuras, você ouve “Clube da Esquina n. 2”, com Lô Borges.
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15 comentários:
Minino levado! Eu nem bem chego aqui e já sou tomada de emoção com a música da minha vida, das minhas ladeiras, da minha adolescência...É bem este clima, moçada na rua, a gente aprontando. Teve até um caso deste que ficou famoso, só que foi com rapazes da Escola de Minas (UFOP). Eles apostaram de passar nus de uma replúbica à outra (em linha reta) no meio da procissão. E assim foi, só não contavam é que os caras da outra república trancariam a porta e lá ficaram completamente nus no meio da procissão. Isto virou até parte de filmes e especiais. Os dois rapazes foram salvos pela "Verônica" com o rosto de cristo... Foi um auê só... Como a gente tem histórias gosotosas prá contar... Você tem um "relógio" que nos faz suspirar com as ternuras antigas que acabamos de descobrir,ãinda muito bem vivas em nossos corações...Eu estou indo trabalhar agora, mas vim dar meu bom dia prá você!Beijão!
(Ah, PRIMEIRONAAA a comentar!)
"Tudo tão lindo... tudo natural..."
Adoro seu "cafofo", Marco!
Nossa! Brinquei muito na rua!! Mas quando faltava luz, colocávamos velas em cima do muro achando que alguém fosse assustar! Lata cheia de água ligada a uma cordinha fina...bons tempos heim?
kkkkkkkkk, adorei a coragem e o susto dos moleques,kkk.
Também brinquei muito na rua com minha avó sentadinha na calçada tricotando sobre a vida alheia,ô tempo bão!!
Esqueceu de falar do pique baleia, do [humm]Pêra,Uva ou Maçã que meninos e meninas juntos brincavam,lembra??
Meus filhos ainda brincaram muito pela rua da Tijuca onde morávamos,tiveram infância linda.
A partir de hoje passarei a assinar "Certinha do Lalau do Século 21" tá? rsssss,agora peixão é demais né não? Deixei uma resposta lá na Van...vai ver.
Lindo dia,
beijossssssssssssssss
opss, lá na Vendetta.......nada de Van,rss
mais beijossssssss
Tadinho dos meninos!! Fui lendo e imaginando a cena, já tava até esperando vc dizer que a luz voltou, mas achei que um dos dois ia pisar na bola. ou seja, não tinha tirado a roupa. *risos. Seria muita sacanagem com o amigo né? beijão
Uma delícia ter recordações... ainda mais pitoresca como essa! E a sua maneira de escrever, tão cativante, faz com que me sinta participante do fato (só não na 'pele' das fofoqueiras e nem dos peladões...rs...)Sabe, caro Marco, que aqui ainda se brinca na rua, as senhoras conversam enquanto fazem tricôs ou bordados, e os senhores jogam dominó ou conversa fora? Só em cidade pequena que - ainda - tem um bocadinho de segurança... Beijos.
Hehehehehe... eu tenho a impressão que o meu IVDM tá sempre apitando. A minha esquina de reunião com os amigos é corredor vs. cozinha , num canto da sala. :D . Às vezes sinto falta dessas discussões ao ar livre.
Um abraço!
PS:Seguinte...o Sérgio Mendes é brasileiro , sua música é brasileira , não podemos negar. Porém , por ter se radicado nos EUA , ele acabou fazendo música brasileira pra gringo , ou seja , ele usa e abusa dos clichês. Eu sempre comparo ele com o Jorge Ben , que teve essa fase inicial com ele - bossa-nova - e soube se renovar perfeitamente , incorporando rock , soul , funk , e outras misturas negras. Nada contra o Sérgio Mendes , mas meu ouvido não escuta...
oiee,vc é divertido mesmo,nunca imaginei uma brincadeira dessas,risssss,fala sério né,ninguem merece,hoje se ficar assim na rua ,vão pensar que é ladrão ou coisas assim,é uma pena nao ter essa liberdade de andar ou conversar na rua ,me diga uma coisa como sabe que é minha foto? quem te falou?, vou te linkar posso/, assim estarei sempre aqui te lendo adoreii,bjsssss
oieeeee,bom dia querido ,vim agradcer por tao elogiadas palavras,ficarei feliz se colocar meu selinho aqui no seu blog´,e vim buscar o seu link ,assim ficaremos linkados e estarei sempre aqui te lendo,brigaduuuuuuu,por existir,te adoro,bjss
aqui no meu interior ainda se brincam na rua, as crianças correm os 100 m ( inclusive a Bia...fica uma pimenta, de tão vermelha) rsrs...mas sempre com luz e com roupa...
Sabe, rsrs...vcs. não deviam ser fáceis...rs.
Tadinha das mães...
beijão
História deliciosa, meu caro. Aliás, você tem-se revelado um memorialista nato. Mas estou aqui também por outro motivo: gostaria de convidá-lo para participar da enquete que o Balaio está promovendo sobre os "20 Melhores Filmes", segundo a opinião dos internautas que lêem o meu blogue. Abraços.
Rá, rá, rá! Fala a verdade: essa estória não aconteceu na semana passada, e tu tirando onda de que foi na juventude?! Rs. amigo, eu gostaria mesmo que tu lesses e comentasses sobre o post anterior ao atual poema, dá uma olhada! Sobre estes dois últimos posts, muito bons! Gostei da simplicidade e do estilo direto do segundo - e o que dizer do final poético dos "vaga-lumes pisca-piscando" depois de uma farra de moleques? Valeu, primo, abração!
Histórias à parte: está preparado para a maior final-do-século-de-todos-os-tempos? Quem vencerá o duelo? Minhoca ou Papel?
Minha doce Claudinha: Rá! Rá! Rá! Rá!...Já ri muito dessa sua história dos peladões na procisão. Ela é melhor que a minha! Imagina, os caras lá, com o vento a favor, sendo salvos pela Verônica com a toalhinha de Cristo! Rá! Rá! Rá!...
Querida Vendetta: Hoje em dia, soltar as crianças para brincar na rua, só se fosse louco! Nem adulto fica na rua! O que dá um certo travo mais nostálgico ainda para nossas recordações, não é?
Obrigado pelo link. Você também ganhou um no Antigas Ternuras.
Querida Ana Clara: E eu adoro quando você vem aqui!
Querida Luma: Nem me fale...Nem me fale...E quando cismávamos de atravessar uma borracha preta comprida pela rua, puxando com um barbante, como se fosse uma cobra? Uma vez quase matei uma grávida de susto...
Minha doce Marcia: Não esqueci, não! Se fosse relacionar todos os folguedos de minha infância, dava um post de umas cinco páginas. Provavelmente, esse pique-baleia tinha um outro nome na minha localidade. Sim, meninas e meninos brincavam juntos. No pêra-uva-maçã, era a hora da gente filar uns beijinhos...Ê lasquêra...
Já vi a sua resposta na Vendetta e quase me mijei de tanto rir...
Querida Suzy: Pô, se a luz voltasse e mostrasse que só um dos dois tirou a roupa, ia ter briga de morte! Ré! Ré! Ré!...
Ah, querida Giulia! Que felicidade! Nesses tempos de guera civil, ainda existir um lugar onde crianças brincam na rua, os adultos botam cadeiras na calçada pra conversar, nossa! parece um cantinho do céu!
Caro Bruno Mutante: Lamento dizer, mas a sua geração não vai poder ter uma infância como a minha teve nem em mil anos. Comoé que vocês poderiam se reuniri na rua num clima como esse?
Querida Angel: Você está certíssima. Já pensou hoje em dia, dois caras passando pelados? Iam levar tantos tiros que virariam peneiras...Já coloquei o seu link no AT.
Doce Claudia: Que felicidade sua filha e as demais criança poderem correr livres pela sua roupa. Mesmo de roupa.
Você nem imagina o que aprontávamos... Tenho histórias de minha infância e adolescência para contar aqui até o ano 3006!
Caro mestre Moacy: Já vou correndo ver. Convocação do Balaio, pra mim é uma ordem!
Caro "primo" Dilberto: Imagina, nesse fuzuê de balas comendo soltas, dois caras resolvendo correr pelados pelas ruas...Rá! Não dariam dois passos e cairiam cheios de chumbo!
Você acredita que eu escrevi um comentário para este seu post e a conexão no meu trabalho caiu? Mas eu vou escrever outra novamente. Primo é primo, não é?
Caro Vice Ronie: A sua batata e a do seu time bacalhoso sebento está assando...
Valeu, moçada! É sempre uma felicidade tê-los aqui no meu velho bazar de reminiscências...Abraços e beijinho e carinhos e ternuras sem ter fim!
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